O ex-Presidente de Cabo Verde era, há 40 anos, um dos principais comandantes militares do PAIGC, em nome dos quais falou na proclamação da independência da Guiné-Bissau.
Volvidos 40 anos sobre a proclamação da independência da Guiné Bissau, as suas Forças Armadas transfiguraram-se "em instrumento de tirania e de delinquência". A acusação é feita pelo ex-Presidente da República de Cabo Verde, Pedro Pires, que lutou de armas na mão pela independência da Guiné.
Pedro Pires, de 79 anos é um dos mais respeitados dirigentes dos movimentos de libertação, fala com a autoridade reforçada de quem representou as Forças Armadas Revolucionárias do Povo (FARP) na cerimónia de proclamação da independência da Guiné-Bissau, no dia 24 de Setembro de 1973.
Numa entrevista concedida ao Expresso a propósito dos 40 anos da independência da Guiné-Bissau, Pedro Pires entende que o "objetivo principal" do PAIGC foi alcançado: "as independências das colónias da Guiné-Bissau e de Cabo Verde". Reconhece, no entanto, que "a segunda parte" do projeto - a unidade daqueles dois territórios - "fracassou". Sem nunca mencionar nomes, diz que a segunda dimensão do projeto do PAIGC e do seu líder, Amílcar Cabral, "foi interrompido pelo golpe de Estado que teve lugar na Guiné". Pedro Pires alude ao golpe militar de 14 de Novembro de 1980, em que o Presidente da República Luís Cabral (meio irmão de Amílcar) foi deposto por "Nino" Vieira, que assumiu então a chefia do Estado.
ASSASSINATO DE AMÍLCAR CABRAL E O RAPTO DE ARISTIDES PEREIRA
Para o antigo primeiro-ministro e Presidente da República de Cabo Verde, que foi um dos principais comandantes da guerrilha do PAIGC na Guiné, "não seria objetivo nem razoável pretender atribuir responsabilidades unicamente a Amílcar Cabral. O insucesso foi, em grande medida, da responsabilidade dos seus sucessores que não souberam construir as condições subjectivas e os mecanismos políticos para a viabilização do projecto".
O projecto de unidade entre a Guiné e Cabo Verde terá começado a ser posto em causa aquando do assassinato do próprio Amílcar Cabral, em Janeiro de 1973. Baleado por um dos seus guarda-costas, a morte do fundador do PAIGC acentuou a enorme tensão existente entre guineenses e cabo-verdianos. "Estou em crer que o assassinato do Amílcar" e o simultâneo "rapto e tortura do Aristides Pereira enfraqueceram, em boa medida, a confiança necessária" entre os dirigentes e militantes do partido.
Recusando-se a especular "sobre como faria Amílcar Cabral para garantir a realização do projeto unitário", prefere manifestar uma outra "inquietação", não tanto sobre o passado, mas sobre o presente: "Como foi possível a transfiguração das valorosas FARP em instrumento de tirania e de delinquência?"
OS EUA QUEREM CAPTURAR O GENERAL ANTÓNIO INDJAI
Como se sabe, as Forças Armadas da Guiné têm estado no centro da vida política e económica do país, promovendo sucessivos golpes de Estado pelo menos desde Maio de 1999, quando uma Junta Militar liderada pelo brigadeiro Ansumane Mané tentou depor o Presidente da República, Nino Vieira. Ansumane e Nino foram dois dos muitos militares que, desde então, foram assassinados pelos seus camaradas de armas, quase sempre em circunstância de extrema violência.
O atual poder em Bissau resultou de mais um desses golpes de Estado, consumado a 12 de Abril do ano passado. Um dos homens mais poderosos do país, o almirante Bubo Na Tchuto, foi detido em Abril passado em águas internacionais por forças da Agência Antidroga dos EUA (DEA), aguardando-se o início do seu julgamento. Os EUA estão mesmo decididos a capturar o atual Chefe de Estado-Maior das Forças Armadas, general António Injai, considerado o homem-forte do país. Injai é suspeito, tal como o seu camarada da Marinha, Na Tchuto, de tráfico de droga e de armas. EXPRESSO