segunda-feira, 12 de novembro de 2012
OPINIÃO: "O Parlamento e os militares golpistas da Guiné-Bissau"
POR: António Luvualu de Carvalho|*
A questão que não parece ter resposta imediata é esta: até onde vão os militares golpistas da Guiné-Bissau? Ficou-se a saber que os militares que protagonizaram o sangrento e condenável golpe de Estado equacionam dissolver o Parlamento nacional daquele país.
O porta-voz do Estado-Maior General das Forças Armadas da Guiné-Bissau, o coronel Daba Na Walna, disse que o melhor para o período de transição em curso no país era “se calhar dissolver o parlamento”.
Segundo as palavras daquele que se tornou no principal rosto dos golpistas de 12 de Abril passado “os dois principais partidos, PAIGC e PRS, não se entendem e o Parlamento não funciona, mas temos urgências e compromissos durante este período de transição. Talvez um dia se chegue ao entendimento de que o melhor seria a dissolução”, concluiu. Este é um movimento que, a concretizar-se, será tão gravoso quanto foi o golpe de Estado orquestrado pelo general António Injai e materializado pelos seus pares. Será que as autoridades continentais não possuem sensibilidade suficiente para ver que o povo guineense é o único que sofre com este silêncio continental?
Um caminho a seguir seria naturalmente a colaboração da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental CEDEAO da qual a Guiné-Bissau é membro de pleno direito. Mas, os principais líderes da organização de integração regional, em vez de ajudarem o seu par, caíram num espírito mesquinho de inveja e criaram várias intrigas que culminaram com a saída da Missão de Angola na Guine-Bissau (MISSANG) presente no território por solicitação do falecido Presidente guineense Malam Bacai Sanha, que se deslocou pessoalmente a Luanda para pedir os bons ofícios do Executivo nacional apelando ao espírito de uma luta comum pelas independências nacionais e pelos laços históricos que unem os dois países.
Angola aceitou ajudar o país em crise no âmbito de uma cooperação bilateral e esteve empenhada na reformo do seu sector de defesa e segurança conforme solicitação feita enviando mesmo forças que ajudariam na formação de um novo Exército (tudo a pedido do governo de Bissau). Mas esta presença angolana incomodava muita gente já que todas as redes de comércio obscuro estavam em risco de desaparecer.
O povo aclamava as forças angolanas (vimos várias imagens pela televisão) mas os militares locais e outras forças regionais com interesses inconfessos detestavam.
Depois de reformular o sector da defesa e como o da segurança também estava contemplado no acordo, certamente que o próximo passo seria a expulsão de traficantes de droga e a imposição da ordem no país. A meu ver, este é o factor principal que pesou muito para que as autoridades golpistas pressionassem a MISSANG a abandonar Bissau.
Como sempre nos habituou neste tipo de situações de tensão, o Executivo angolano tomou a melhor decisão e retirou-se pacificamente do país, mesmo com todas as provocações que eram feitas às nossas forças para que ripostassem e rebentasse um conflito. Entretanto, desde que a MISSANG saiu de Bissau, o tráfico de drogas atingiu níveis surreais.
O jornal norte-americano “New York Times” revela que, após o golpe de Estado de 12 de Abril, aumentou, consideravelmente, o tráfico de drogas na Guiné-Bissau, classificando o país como um “narco-Estado”.
Na edição online de 1 de Novembro, o “New York Times” garante que, desde que os militares assumiram o poder, aumentou o tráfico de drogas no país, o que faz supor que se tratou mais de um “golpe de cocaína” do que de um golpe de Estado.
A publicação garante que especialistas consideram que aumentou o número de aviões bimotores a realizarem travessias sobre o Atlântico, que transportam toneladas de cocaína provenientes da América Latina, que são descarregadas em ilhas desabitadas e regiões remotas da Guiné-Bissau, para depois seguirem para o norte. Para além disso, as Nações Unidas garantem que entre Abril e Julho, pelo menos 20 aviões de pequena dimensão eram suspeitos de transportar droga para a Guiné-Bissau.
Quando seria de esperar uma condenação da CEDEAO, eis que surge mais uma notícia de apoio aos militares golpistas. Na última quarta-feira, o presidente da Comissão da CEDEAO, Kadré Désiré Ouedraogo, assinou um memorando de entendimento sobre a implementação do programa de Reforma do Sector de Defesa e Segurança da Guiné-Bissau.
Com este convénio, a CEDEAO vai disponibilizar à Guiné-Bissau uma soma estimada em sessenta e três milhões de dólares, para a subvenção no âmbito do longo processo de Reforma no Sector da Defesa e Segurança do país.
Da parte da Guiné-Bissau, o Governo de transição irá comprometer-se a contribuir com 10 por cento deste fundo de pensão para o arranque do processo. Depois desta cerimónia, também foi firmado outro acordo entre o Governo e a Missão da CEDEAO na Guiné-Bissau, com a finalidade de instalação da ECOMIB, Missão Militar da CEDEAO na Guiné-Bissau, no plano de assistência técnica inserido na Reforma do Sector da Defesa e Segurança (um autêntico copy paste do protocolo que Angola tinha com a Guiné-Bissau que estabelecia a MISSANG).
É caso para nos perguntarmos: será que este acordo tem mesmo pernas para andar? Os países da CEDEAO têm os seus problemas internos e não creio que vão perder tempo com a Guiné-Bissau.
A Nigéria vive a crise que todos conhecemos com as milícias Boko Haram, a Costa do Marfim está dividida em dois depois da deposição do Presidente Laurent Gbagbo, a Guiné Conacry não tem meios para ajudar Bissau, o Senegal com um presidente jovem e com visão democrática dificilmente irá patrocinar o golpe, a Gâmbia não apoiará os golpistas e Cabo Verde condena sempre que pode o golpe.
* Docente universitário in 'Jornal de Angola'