sábado, 17 de novembro de 2012
França ameaça encerrar embaixada na capital guineense
A França que recentemente manifestou-se disponível a apoiar as autoridades de transição da Guiné-Bissau na luta contra a impunidade, combate ao narcotráfico e a reforma do sector da defesa e segurança, considera agora a hipótese de vir a encerrar a sua missão diplomática na capital Bissau.
Apoiante das soluções encontradas pela CEDEAO para a crise guineense pós golpe de 12 de Abril, Paris vê-se entretanto mediante o alerta dos seus serviços secretos, na iminência de ter que levantar a âncora e partir de Bissau. Em causa os riscos de exposição da sua embaixada e do pessoal diplomático a potenciais acções terroristas na região, em particular na Guiné-Bissau, conhecida pela permeabilidade das suas fronteiras e pela crescente actividade do narcotráfico, esta com alianças ao extremismo islâmico na região.
Uma combinação letal aos interesses dos países ocidentais e da França em particular, que receia que as ameaças dos grupos jihadistas com vínculos a Al Qaida que operam no norte no Mali, encontrem na anarquia em que se transformou a Guiné-Bissau, terreno propicio a sua exequibilidade. Recorde-se que grupos extremistas islâmicos que controlam o norte do Mali , nomeadamente o Ansar Dine e o Movimento da Irmandade e Jihad para a África Ocidental ( MUJAO) , com ligacoes a rede Al Qaida para o Magrebe, ameaçaram atacar os interesses dos países ocidentais na região, caso a CEDEAO, aposte na intervenção militar para devolver a soberania e a integridade territorial do norte daquele país saheliano, a Bamako.
Com o engajamento de Paris que assume o apoio logístico a operacao militar gizada pela CEDEAO, a forca de intervenção oeste africana para o Mali, vai em principio ser realidade. Conta para já com o aval da União Africana e do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que unanimemente e sob proposta da Franca, aprovou recentemente uma resolução a propósito. Numa operação alinhavada em parceria com Washington, Drones franceses vigiam a região, de actividades terroristas e crimes transfronteiriços.
E é pois confrontada com as ameaças dos grupos extremistas islâmicos e com o cenário do recente ataque contra o consulado dos Estados Unidos da América, em Benghazi, Líbia, que vitimou o embaixador americano naquele pais do norte de África, em presença, que temendo pelo pior, a França tem vindo a considerar a reavaliação da presença da sua missão diplomática na capital guineense Bissau. A se concretizar, a decisão francesa representaria um sufoco final de um regime de transição que faz frente a um cerrado isolamento internacional que paradoxalmente a Franca e os Estados Unidos da América têm procurado atenuar.
E que Paris e Washington receiam que perante um enclausuramento do poder bissau-guineense, na sequência do isolamento internacional, a Guiné-Bissau se transforme definitivamente num santuário para o crime transfronteiriço e uma ameaça narco-terrorista na região.
Fronteiras vulneráveis
Para a crescente apreensão de Paris para com a porosidade das fronteiras nacionais guineenses terá por certo contribuído, a recente acção de um grupo de homens armados contra quartel dos para-comandos, por sinal uma das mais bem guarnecidas unidades militares do país na periferia de Bissau.
É que fazendo fé na versão das autoridades de transição guineenses, o ataque foi liderado por um capitão do exército, que teria conseguido infiltrar-se no território nacional, através da fronteira com a província senegalesa do Casamansa. Um argumento de que as autoridades de transição têm-se valido para justificar a tese de uma suposta conspiração internacional mas que acaba por deixar Bissau, numa situação incomoda quanto mais não seja por expor a vulnerabilidade das suas fronteiras. Remonta entretanto a Janeiro de 2008, o primeiro episódio a despertar as suspeitas de Paris para com a porosidade dos 350 quilómetros da fronteira terrestre guineense.
Numa operação conjunta com a polícia guineense, os serviços secretos franceses detiveram num hotel de Bissau, Sidi Ould Sidna e Mohamed Ould Sidi Chabarnou, dois operacionais da rede terrorista Al Qaida do Magreb, envolvidos um mês antes, no assassinato de quatro turistas franceses, na Mauritânia.
Os dois jihadistas teriam conseguido iludir a perseguição policial transfronteiriça e refugiar-se na Guiné-Bissau alegadamente com apoio de células locais daquele grupo extremista. Extraditados para a Mauritânia num controverso processo, o julgamento dos extremistas islâmicos por um tribunal em Nouakchott e a consequente condenação a morte, em 2010, ficaria marcado por revelações surpreendentes, nomeadamente o facto de Sidi Ould Sidna ter passado por um campo de treino de terroristas da rede Al Qaida na Argelia e de ter fixado residência na Guiné-Bissau. Aliás, seria o conhecimento do terreno e o relativo domínio do crioulo bissau-guineense, a determinar a opção pela Guiné-Bissau, como país de refúgio na fuga a perseguição policial transfronteiriça.
Recorde-se que ao ser escoltado pelos militares guineenses para o avião da Força Aérea da Mauritânia que o aguardava no aeroporto de Bissau, durante o processo de extradicao, Sidi Ould Sidna , ameaçou em crioulo “fazer Bissau pagar pela detenção dos combatentes da Jihad”. Na altura as autoridades policiais guineenses procederam igualmente a detenção de três outros cidadãos mauritanianos com residência em Bissau, acusados de cumplicidade na fuga dos dois extremistas islâmicos, facto que acabaria por levantar suspeitas quanto a existência de células de organizações terroristas, no país.
Verdade ou não o certo é que uma fonte da investigação policial guineense que pediu anonimato admite o facto do caso “Sidna “ ter sido mantido à margem nas investigações as circunstâncias do assassinato a bomba, um ano depois, do então chefe de Estado-Maior das Forças Armadas guineenses, o general Tagme Na Waie. Já na altura confrontado com a complexidade da organização das células terroristas na África Ocidental e sua conexão ao narcotráfico, Washington que se manifestara disponível a apoiar as autoridades bissau-guineenses nas investigações do caso, alertara para os potenciais vínculos entre o narcoterrorismo na região e o assassinato daquela alta patente militar guineense.
Nelson Herbert