quinta-feira, 14 de novembro de 2013
Fora com os falhados!
Neste dia 14 do mês de Novembro, há 33 anos, um grupo de homens fardados, destemidos, pegou em armas e depôs um Presidente da República, o primeiro da história da Guiné-Bissau - Luís Cabral. Contudo, parece que já ninguém se recorda. Eu, que fazia catorze anos de idade precisamente um dia depois dessa terrível aventura, não mais me esquecerei de alguns pormenores que os meus olhos viram: dos camuflados impecáveis desses homens, do brilho das suas Kalashnikov; dos tanques de guerra a fazer rali nas avenidas, dos gritos ululantes das pessoas.
Trinta e três anos depois, o que assistimos? Ainda estamos a pagar na pele por um movimento apelidado sabiamente de 'reajustador', que apelou à "concórdia nacional" em discursos inflamados para de seguida começar a matança que até aos dias de hoje assistimos, impotentes.
Não haja dúvidas: a desintegração do Estado da Guiné-Bissau haveria de começar, assim que a poeira assentasse. E não tardaria. De repente tornámo-nos tão pequenos. Fomos traídos pela revolução e pelo seu Conselho. A desconfiança instalou-se, a calúnia prevaleceu e trouxe o ódio. Desde então, morremos um bocadinho todos os dias. Choramos calados.
Que temos nós hoje? Bom, temos um Estado cujo apelido devia ser 'falhado'; uma Nação esventrada, impotente e de gente completamente descontrolada - uma espécie de mãe madrasta; um País que se tornou numa linha de recepção e de expedição de cocaína à escala planetária - aos olhos de todos, comunidade internacional incluída. Estamos na presença de um Estado posto de joelhos pelo narcotráfico, tomado pela ponta da baioneta e pela catana. E, para compor o ramalhete... um Estado organizadamente, digamos que... desorganizado.
O nosso País alberga, hoje, criminosos de toda a espécie, de todo o mundo: gente que, cumprida a pena onde quer que fosse, preferiu sabiamente mudar-se para cá, para um País mergulhado na mais completa anarquia, sem rei nem roque. Não há, para amostra, um homem honesto, uma esposa fiel, uma donzela recatada. O País tornou-se promíscuo, uma meca do hedonismo.
Torna-se difícil imaginar colecção mais interessante de figuras físicas e psicológicas - até patológicas - reunidas debaixo destes largos céus. Torna-se ainda mais difícil ter alguém para conversar, ouvi-lo citar grandes nomes da literatura, ou rir-se das teses que Charles Darwin nos legou, ou ainda comentar com inteligência e novidade este ou aquele livro, uma opinião.
Perguntam então: "O que faz um homem feito num lugar como este?". Sorrio, e respondo: "Este lugar é apenas o meu País. Um País que me surpreende todos os dias." António Aly Silva