sexta-feira, 5 de abril de 2013

De saudar


O anúncio, ontem à noite, da detenção do almirante José Américo Bubo Na Tchuto, por agentes norte-americanos encarregados do combate ao narco-tráfico, foi uma autêntica bênção para as populações da Guiné-Bissau, uma vez que se trata de um dos elementos mais desestabilizadores do país, a par do actual Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, general António Indjai. Apontado já há três anos pela Administração Obama como um dos grandes narco-traficantes da África Ocidental, o almirante Bubo Na Tchuto, antigo Chefe do Estado-Maior da Armada, que disputava a Indjai a liderança de todos os militares guineenses de etnia balanta, foi finalmente detido, juntamente com quatro outras pessoas, em águas internacionais, muito perto de Cabo Verde.

Esta detenção de um dos homens mais ambiciosos e perigosos da Guiné-Bissau pode ser um sério aviso às pessoas sem escrúpulos que da Venezuela, da Colômbia e de outros territórios latino-americanos procuram fazer chegar drogas à Europa, valendo-se para isso de regimes africanos fracos ou que não dispõem de meios para controlar a circulação de cocaína e de outros produtos igualmente desestabilizadores. Ao encaminharem José Américo Bubo Na Tchuto para as ilhas de Cabo Verde, com as quais Washington mantém um excelente relacionamento, os agentes norte-americanos demonstraram que acordaram tarde, mas finalmente acordaram, para uma autêntica cruzada internacional que é necessário fazer contra os narco-traficantes que usam o Senegal, a Gâmbia, a Guiné-Bissau e a República da Guiné para o seu desejo de inundar de droga a Europa Ocidental.

Bubo Na Tchuto, o Chefe do Estado-Maior da Força Aérea, Ibraima Papa Camará, e muitos outros militares guineenses têm sido suspeitos de fazer narco-tráfico, o qual até aumentou substancialmente desde que há um ano António Indjai deu um golpe de estado, impedindo a segunda volta de umas presidenciais que iriam levar à chefia do Estado o então primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior, líder do PAIGC. A constante intromissão de militares corruptos e permeáveis ao narco-tráfico na vida política da Guiné-Bissau tem sido uma das grandes pragas de um país muito frágil, onde nem sequer um quarto da população se encontra devidamente alfabetizada ou está civicamente preparada para resistir a toda uma série de manobras ilegais que se têm verificado ao longo de décadas.

Maldita cocaína

O jornal The New York Times chegou a considerar o que se verificou faz agora um ano como “um golpe da cocaína”; ou seja, uma jogada avançada dos narco-traficantes para melhor controlarem o país, onde existem numerosos pistas de aterragem e dezenas de ilhas sem o menor controlo. “Dizem que sou um narco-traficante. Se têm provas, apresentem-nas”, afirmou há tempos, em ar desafiador, o general António Indjai, que mantém um estilo de vida muito superior ao que permitem os seus proventes de Chefe do Estado-Maior de umas Forças Armadas que se queixam de serem muito pobres. O Presidente interino Manuel Serifo Nhamadjo e o Governo de Transição surgem neste contexto como uma mera fachada de legalidade, num quadro dominado por militares como Bubo Na Tchuto, Papa Camará e António Indjai, não se tornando pois possível desenvolver um ambiente político mais saudável enquanto toda esta camada castrense não passar definitivamente à reforma.

Só com a ida para a cadeia de muitas pessoas do jaez de José Américo Bubo Na Tchuto é que toda uma frota de bimotores deixará de sobrevoar as bolanhas da Guiné-Bissau e a quietude idílica das ilhas Bijagós, muitas das quais não são habitadas. Muito condescendente, o novo representante local das Nações Unidas, José Ramos-Horta, não tem querido dar toda a devida importância a este problema gravíssimo do narco-tráfico, que tem feito com que a Guiné-Bissau adie por demasiado tempo a exploração dos recursos naturais em que é rica; tanto em terra como no mar.
Se a ONU é demasiado frouxa, ou se acaso se encontra manietada por excessos burocráticos, ao menos que haja alguém, seja onde for, que seja capaz de libertar as populações guineenses das múltiplas pragas que sobre elas se têm abatido.

Jorge Heitos