segunda-feira, 28 de maio de 2012
INTERVENÇÃO MILITAR NA GUINÉ-BISSAU? SIM, MAS POR QUEM?
Afinal, quase dois meses depois do golpe militar na Guiné-Bissau, onde estamos? Os golpistas continuam no poder, os líderes eleitos estão refugiados em embaixadas na capital do país ou no estrangeiro, as organizações internacionais não se entendem, todos ameaçam, mas ninguém quer intervir decisivamente.
Por: Miguel Machado
Neste tempo, Portugal e algumas organizações internacionais, das Nações Unidas (ONU) à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), passando pela União Europeia (UE) e pela Comunidade dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), condenaram o golpe e, em patamares de violência verbal variáveis, ameaçaram o novo poder local. Resultado? Mais uma vez se prova que a retórica politica quando não é suportada por força militar credível…cai no ridículo.
Do inicial tom ameaçador do Ministro dos Negócios Estrangeiros português, à tomada de posse do Coronel-Maior Gnimanga Baro do Burkina Faso como comandante da força multinacional da CEDEAO para intervenção na Guiné - com 1 batalhão de 600 militares para quê? Ocupar um bairro de Bissau? - vimos de tudo. Em Portugal, após a precipitação inicial parece que a realidade foi percebida e o tom baixou. Centramo-nos, e bem, na eventual retirada dos nossos compatriotas, embora com uma politica de comunicação algo confusa, senão perigosa.
As Nações Unidas pedem dinheiro para uma eventual força, a União Europeia fica-se por sansões de duvidosa eficácia e a CEDEAO parece afinal pactuar com a revolta (sempre sai mais barato e é menos arriscado!).
Mas quem poderia afinal intervir na Guiné-Bissau? Admitindo que se conseguia algum consenso político regional - o que até agora não aconteceu - e que se queria realmente estabilizar a Guiné-Bissau, quem tem essa capacidade?
Se o objectivo fosse lançar rapidamente uma operação com probabilidade elevada de sucesso, ou seja, “entrar em força para ganhar” (tipo NATO na Bósnia em 1996/60.000 militares ou a INTERFET em Timor-Leste em 1999/11.500 militares), só os países da NATO e/ou da União Europeia têm essa capacidade. As Nações Unidas, como é sabido (ou devia ser) só em condições muito especiais aceleram os seus intrincados mecanismos de decisão.
Talvez poucos hoje se lembrem, mas em 2006 a Aliança Atlântica realizou o exercício “Stead Fast Jaguar” (SFJ) em Cabo Verde. Bem perto da Guiné-Bissau portanto, para fazer a “validação final” da sua Força de Reacção Imediata, a célebre NRF que nunca actuou mas está em permanente alerta deste então. Forças portuguesas estão ciclicamente incluídas nestas NRF’s o que aliás custa bom dinheiro.
Nesse SFJ em 2006 mais de 7.000 militares, navios e aeronaves de todo o tipo, realizaram várias acções em diferentes ilhas, tendo desembarcado cerca de 2.500 militares e 600 veículos. Tudo isto com a cobertura mediática de dezenas de jornalistas levados para Cabo Verde em voos especiais da NATO.
Só falta, portanto, convencer a NATO a intervir, mas haverá capacidade para provar aos nossos aliados essa necessidade? Talvez se devesse ter começado por aí.
Este artigo foi originalmente publicado no “Diário de Notícias” em 28 de Maio de 2012.