"Caro Aly,
Permita-me mais uma vez juntar a minha voz na polémica em curso, resultante da recusa pelo Bloco dos Cinco Candidatos dos resultados eleitorais publicados pela Comissao Nacional de Eleições, alegando fraudes no escrutínio presidencial. Tenho o sentimento que este país está longe de consolidar a sua democracia. A razão desta afirmação é simples: A cultura de mentiras e conformismo está enraizada nesta sociedade. As pessoas têm medo de debates sérios sobre questões fundamentais da República.
Os candidatos que hoje constestam a organização do processo eleitoral são guineenses e pais de família. Têm o direito de protestar quando coisas não são claras. E não podemos, em nenhum caso, com ânimo leve, lhes impedir de exercer esse direito. Vejo com muita tristeza a crónica demagogia nesta cidade. Os que ontém viam no Henrique Pereira Rosa e Manuel Serifo Nhamadjo modelo de pessoas moderadas não hesitam hoje chamar-lhes de perturbadores simplesmente porque contestam as irregularidades flagrantes, já admitidas por uma parte dos membros da CNE.
O verdadeiro debate devia ser a volta de seguintes questões: Quem mandou emitir cartões a novos eleitores quando a decisão era para emitir só cartões da segunda via? Porquê o Desejado Lima da Costa não reuniu a plenária antes das deliberações? Porque as imagens filmadas em Safim sobre alegado indivíduo apanhado com centenas de cartões, carimbos, não foram difundidas na TGB? Temos a obrigaçao de aceitar um Presidente eleito nestas condições?
Devemos ter a coragem de reconhecer que o organismo encarregue de organizar o processo eleitoral, neste caso a CNE não inspira a objectividade pouco menos a confiança num processo capital na vida do país. Todos nós conhecemos esta pequena cidade, Bissau, e sabemos como são construídas as alianças oportunistas. Os que criticam a declaração do Secretário Executivo da CNE, António Sedja Man, evocando o seu militantismo ao PRS, deviam pelo menos ter a vergonha de falar alto, pois os mesmos, António Sedjaman e Orlando Veiga estavam na CNE a quando da proclamação da vitória de Malam Bacai Sanhá nas eleições presidenciais de 2009 contra o mesmo Koumba Yalá, líder dos renovadores.
Porque não se desolidarizaram com as deliberações da CNE em 2009? As críticas a António Sedjaman e Orlando Veiga deviam albergar o Desejado Lima da Costa, parceiro fiel do candidato do PAIGC, Carlos Gomes Júnior. Há dúvida sobre isso? Quem não se lembra das declarações incendiárias do mesmo Desejado em 2005, na altura porta-voz do candidato Bacai contra Nino Vieira, recusando categoricamente os resultados publicados pela CNE?
A democracia é feita de CIDADAOS ESCLARECIDOS e não de MILITANTES CONFORMISTAS. Foi por causa do conformismo cego que cerca de 100 mil jovens ficaram de fora da votação de 18 de Março. Foi por causa do conformismo e de ânimo leve que os mesmos erros do passado se repetem neste país.
Os Guineenses gostam de falar tanto na paz e na estabilidade. Estes dois conceitos não caiem do ceu. Temos que trabalhar com base nos princípios da verdade, justiça e responsabilidade para alcançâ-los. Alguns citam agora o Senegal como modelo da democracia. Concordo. Mas, foi na base de um combate árduo. Muitos senegaleses tombaram. Até Janeiro último ninguém acreditava numa transição democrática pacífica no Senegal por causa do movimento social que abalava aquele país vizinho.
O regime de Wade utilizou todos os meios de Estado, influenciando os orgãos de soberania, sobretudo o Tribunal Constitucional, para impor a sua candidatura cuja finalidade era deixar o seu lugar ao filho, Karim Wade. A reacção da sociedade civil, dos intelectuais, dos jovens senegaleses, cantores e jornalistas a este projecto monarco, é que resultou na alternança do regime a 25 de Março. Prova que nada se consegue na facilidade e na fatalidade pouco menos com na manipulação e no conformismo.
Os autores da fraude eleitoral devem ser responsabilizados. A legitimidade democrática não permite as fraudes. Um Presidente que sai das urnas deve reflectir a vontade popular e não a vontade de “grupinhos mafiosos”. Já estamos fartos de apelos tendenciosos, tais como : “Devemos preservar a paz”; “Devemos acreditar nas instituições da Repúblicas”. Como acreditar nas instituições republicanas armadilhadas pela corrupção e ao serviço de um “homem todo poderoso” que só pensa na fortuna, menosprezando um elemento essencial na política que segundo Nicolas Machiavel é a virtude?
Para concluir gostaria de deixar o seguinte conselho aos meus compatriotas, sobretudo aos actores políticos: Não sairemos deste impasse político com o alarmismo pouco menos com manipulações. Tem que haver o DIALOGO FRANCO entre as partes. Não deve haver o tabu. Todas as questões devem postas em cima da mesa e descutidas com o espírito de patriotismo para que, uma vez por toda, haja a responsabilidade, a democracia na Guiné-Bissau. E de seguida, a paz e estabilidade.
Que Deus lhe abençoe!
Peter"