quarta-feira, 20 de junho de 2012

Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde   Comissão Permanente do Bureau Político - MEMORANDO III


 
Sobre a gestão da crise político-militar da Guiné-Bissau
 
A gestão da crise político-militar guineense resultante do golpe de Estado perpetrado pelo “Comando Militar” do Estado Maior General das Forças Armadas regista numa nova fase, a partir da entrada em funções dos órgãos de transição impostos pela CEDEAO – o Presidenta da República e o Governo.
 
O Presidente da República Interino, mais tarde transformado em Presidente da República de Transição, foi imposto pela CEDEAO, à revelia dos instrumentos legais e constitucionais da Guiné-Bissau e desrespeitando a decisão da Cimeira de Dakar, de 3 de Maio de 2012, dos Chefes de Estado e de Governo da própria Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental, designadamente no seu ponto 22.
 
Na sequência dessa imposição, o nosso Povo e a Comunidade Internacional assistiam, vergonhosamente, a 11 de Maio de 2012, a enorme humilhação da Nação Guineense ao ver o 1º Vice-Presidente da ANP ser cooptado por um Ministro dos Negócios Estrangeiros da CEDEAO, para desempenhar as funções de Presidente da República Interino da Guiné-Bissau.
 
O Presidente da República de Transição e os políticos aliados do <>, confrontados com a inconstitucionalidade dos seus actos e propósitos, decidiram elaborar e assinar, a 16 de Maio de 2012, um documento que denominaram de “Pacto de Transição”, sobre o qual o PAIGC nunca foi convidado a pronunciar-se. O Partido tomou conhecimento do documento, de forma oficiosa, horas antes da sua assinatura pelos seus protagonistas.
 
Além do “Pacto de Transição”, os políticos aliados do <> elaboraram e assinaram um outro documento denominado “Acordo Político”, que permitiu constituir um Governo sem base parlamentar e que excluiu a maioria dos Partidos representados na Assembleia Nacional Popular. As formações políticas excluídas, nomeadamente o PAIGC, o PRID, o PND e a AD, representam 72% dos Deputados na ANP. Apenas o PRS, com 28% dos Deputados na ANP, subscreveu o “Acordo Político” e fez-se representar no Governo de Transição.
 
Portanto, os dois órgãos foram instalados à margem das normas democráticas, legais e constitucionais, o que suscitou uma vasta contestação interna da maioria dos actores políticos e da sociedade civil, assim como da Comunidade Internacional, através das suas Organizações Internacionais, nomeadamente a ONU, UA, UE e CPLP.
 
Em consequência, os órgãos de transição impostos não são reconhecidos por uma larga maioria dos países integrantes dessas Organizações Internacionais, estando o país a enfrentar um bloqueio externo por parte dos seus principais parceiros de desenvolvimento.
 
O PAIGC não se revê nessa solução protagonizada pela CEDEAO, e tem vindo a chamar atenção, à semelhança da Comunidade Internacional, para a necessidade de se operar a transição sem se violar a Constituição e as Leis da República da Guiné-Bissau.
 
Os actos subsequentes demonstraram claramente a inconsistência da solução preconizada pela EDEAO e em fase de implementação, particularmente após adopção da Resolução 2048 do Conselho de Segurança das Nações Unidades, com destaque para os seguintes:
 
• Declaração formal do <> de retorno dos militares às Casernas, o que na prática não se verifica, pois assiste-se a uma omnipresença das chefias militares, particularmente do Chefe do Estado Maior General, no exercício do poder político, através da manipulação dos órgãos de transição impostos pela CEDEAO.
• Utilização abusiva do Hemiciclo da Assembleia Nacional Popular pelo Chefe do Estado Maior General das Forças Armadas, para a sua actividade política. Com efeito, no passado dia 6 de Junho de 2012, o Chefe do Estado Maior General, através da Secretaria de Estado dos Combatentes da Liberdade da Pátria, convocou os Combatentes da Liberdade da Pátria para, entre outros, informar das razões do golpe de Estado de 12 de Abril e dirigir palavras insultuosas e acusações infundadas contra o PAIGC e contra os Combatentes da Luta de Libertação Nacional.
• Persistência do ambiente de insegurança, de perseguição, de ameaças e de terror instalado no País.
• Restrições de liberdades fundamentais, tais como o direito à manifestação, à livre expressão, etc. Continua a registar-se o ambiente em que as manifestações são violentamente reprimidas, à semelhança daquela que ocorreu à frente da sede da UNIOGBIS em Bissau, a 25 de Maio de 2012. Os órgãos de comunicação social públicos estão a sujeitar-se a fortes censuras do actual poder político e do <>.
• Adopção do “Pacto de Transição” e do “Acordo Político” pelos políticos aliados do <>, instrumentos outrora rejeitados pela CEDEAO e que relegam a Constituição da República como legislação subsidiária, ao invés do contrário. Aliás, convêm referir que, por um lado, o “Acordo Político” põe em causa a estabilidade da Comissão Nacional de Eleições (CNE), cujo mandato é inamovível e permite assegurar a transparência do processo eleitoral e, por outro, tende a usurpar as competências constitucionais da ANP.    
 
É urgente a tomada de medidas correctivas, com vista a resgatar o País da situação de bloqueio em que se encontra, cuja persistência poderá conduzir a uma explosão social de proporções imprevisíveis. Essas medidas passam pela aplicação das Resoluções e Recomendações das Organizações Internacionais, nomeadamente a ONU e a CEDEAO.
 
Com efeito, a Resolução 2048 do Conselho de Segurança das Nações Unidas, no seu ponto nº 1 “Exige do <> a tomada de medidas imediatas para restabelecer e respeitar a ordem constitucional, incluindo um processo eleitoral democrático, velando para que todos os soldados regressem às Casernas e que os membros do <> renunciem às suas funções de autoridade”.
 
Esta Resolução da maior Organização Internacional representativa dos seus membros interpela a todos os actores envolvidos na solução da crise político-militar guineense a observarem a exigência nela contida, por forma a facilitar o retorno imediato à ordem constitucional, designadamente:
 
1 – Reposição da normalidade institucional e democrática, isto é o resgate dos órgãos de soberania e permitir o seu normal funcionamento;
2 – Conclusão das Eleições Presidenciais antecipadas interrompidas, cuja realização poderá ser numa data a negociar;
3 – Regresso de todos os militares às Casernas, sendo lhes proibido imiscuir-se nos assuntos políticos;
4 – Renúncia das suas funções das actuais chefias militares, por se terem envolvido no golpe de Estado.
 
Por seu lado, a CEDEAO, nos seus diferentes encontros, recomendou a prorrogação da legislatura da ANP para cobrir o período de transição e a eleição de uma nova Mesa ou o preenchimento de vagas, a fim de permitir o funcionamento normal desse órgão de soberania, com base no seu Regimento e na Constituição da República.
 
Apesar do registo de atropelos às normas regimentais e constitucionais por parte de alguns actores políticos, os Deputados do PAIGC decidiram retomar os seus lugares e a sua actividade na Assembleia Nacional Popular, permitindo que ela reassumisse o seu papel de órgão máximo da soberania da Guiné-Bissau.
 
Infelizmente, continua a registar-se o atropelo às regras democráticas que caracterizam a nossa Assembleia Nacional Popular, por parte do actual 2º Vice-Presidente desse órgão, ao impedir que seja agendado, para a próxima sessão parlamentar, o preenchimento de vagas na Mesa da ANP, contrariando, assim, o seu Regimento e as recomendações do Conselho de Mediação e de Segurança da CEDEAO da sessão extraordinária de Abidjan, do dia 21 de Maio de 2012. Aliás, após a Agenda proposta pelo 2º Vice-Presidente ter sido reprovada pela Comissão Permanente, a ANP encontra-se actualmente sem Agenda para a sua próxima sessão de 29/6/12 a 27/7/12. Caso inédito na história da nossa Assembleia Nacional Popular.
 
Para o PAIGC, o funcionamento normal e estável da ANP passa pelo preenchimento de vagas na Mesa, pelo que não abdicará dessa exigência. O Grupo Parlamentar do Partido foi instruído nesse sentido.
 
O Governo de Transição, constituído basicamente por formações políticas signatárias do “Pacto de Transição” e do “Acordo Político”, carece de base parlamentar, porquanto os seus integrantes provêm de Partidos, maioritariamente, sem assento na Assembleia Nacional Popular e em situação de ilegalidade. Este facto, obviamente, impossibilitará a governação democrática do país durante o período de transição.
 
Daí a necessidade da reposição da normalidade institucional e democrática que permita a estabilidade parlamentar e governativa, sob pena de se comprometer todo o processo de transição política em curso no País.
 
O PAIGC é da opinião que o processo de retorno à normalidade constitucional deve ser conduzido pela formação política guineense com maior representação na Assembleia Nacional Popular, isto é, os titulares dos Órgãos de Soberania devem resultar da vontade popular expressa através do processo eleitoral.
 
Esta opinião é partilhada por mais de 10 formações políticas legais e legítimas, da maioria dos Partidos com assento parlamentar, assim como pelas organizações da Sociedade Civil (organizações sindicais, femininas, juvenis, infantis, ONG’s, etc.) afiliadas na FRENAGOLPE (Frente Nacional Anti-Golpe).
 
É ao PAIGC, Partido com maioria qualificada de 67 Deputados num universo de 100 no Parlamento, que cabe assumir a governação durante a transição política. É a ele que cabe a indigitação do Primeiro-Ministro e a constituição do Governo, cuja composição poderá ser de base alargada.
 
Quanto ao PAIGC, esta será a melhor forma de repor a normalidade institucional e democrática dos Órgãos de Soberania e garantir uma transição política sem grandes sobressaltos na Guiné-Bissau.            
 
O PAIGC congratula-se, mais uma vez, com os esforços da Comunidade Internacional na busca de soluções para a crise político-militar da Guiné-Bissau, particularmente a ONU, a UA, a UE, a CEDEAO e a CPLP, e regozija-se com a decisão do Conselho de Segurança das Nações Unidas em recomendar uma maior articulação e coordenação na intervenção dessas organizações.
 
Essa articulação deve ser abrangente e envolver todo o processo de retorno à normalidade constitucional, desde o regresso dos militares às Casernas até à reinstalação dos órgãos legítimos, passando pela constituição e instalação da força conjunta de manutenção da paz e de apoio à reforma dos Sectores da Defesa e Segurança, com base no Roteiro CEDEAO/CPLP.  
 
Feito em Bissau, aos 14 dias do mês de Junho de 2012.
 
 
A Comissão Permanente do Bureau Político