quinta-feira, 14 de junho de 2012

Guiné-Bissau, diferentes olhares da CEDEAO para a situação pós golpe



1 . Estão a alterar-se as tendências de aparente contemporização com o recente golpe de Estado na Guiné-Bissau até há pouco notadas na CEDEAO e, por formas diferentes, entre países da organização. As referidas tendências chegaram a ser interpretadas como ditadas por cálculos visando uma “subtil legitimação” do golpe.

O declínio das referidas tendências é atribuído a “reapreciações” da situação determinadas e/ou influenciadas por factores como os seguintes:

- Dados novos sobre o golpe do Estado e sobre o status quo por ele criado – recolhidos e verificados por pessoal do contingente destacado da CEDEAO.

- Persiste, com mais evidentes sinais de aperto do que de abrandamento, o clima de isolamento político e de sanções a que está sujeito o “regime de transição” instalado no seguimento do golpe de Estado.

A atitude complacente com o golpe de Estado que a CEDEAO inicialmente deixou transparecer foi considerada reflexo de ínvios interesses de países da região, como Senegal e Nigéria, mas também de grupos obscuros com capacidade para interferir em seu próprio proveito em políticas da organização.

O Senegal, para além do desapreço a que votava Carlos Gomes Jr, avolumado por um arrastado contencioso fronteiriço (AM 479), terá visto no golpe de Estado uma oportunidade para passar a ter na Guiné-Bissau um interlocutor mais cooperante com os seus esforços de neutralização da guerrilha independentista no Casamansa.

A dinâmica anti-angolana imprimida ao golpe de Estado pelos seus mentores, serviu, por sua vez, de “engodo” destinado a garantir, no mínimo, a neutralidade da Nigéria. A intrusão que a presença militar angolana na Guiné-Bissau representava para as influências regionais que a Nigéria reclama, iria dissipar-se.

2 . A conduta relativamente benevolente da CEDEAO face ao golpe, vista como uma negação dos seus próprios princípios, deu lugar a um foco de disinteligências internas.
Registaram-se advertências como a de que uma quebra de autoridade política e moral da organização poderia potenciar uma vaga de putschs na região.

Aos dois únicos países que desde o primeiro momento condenaram o golpe, Gâmbia e Rep da Guiné, juntou-se agora o Níger. E há sinais de que o Senegal, agindo por influência de um incremento recente de acções da guerrilha no Casamansa, supostamente com origem na Guiné-Bissau, pode vir a rever a sua posição.

Os militares senegaleses que integram a força da CEDEAO estacionada na Guiné-Bissau, têm a dupla função de prestar atenção a “engajamentos” locais com o movimento separatista do Casamansa. Julga-se que têm origem na Guiné-Bissau (não na Gâmbia) acções recentes de infiltração de armas no território.

3 . Os novos dados recolhidos pelo pessoal da CEDEAO, em circunstâncias favorecidas por afinidades étnicas com grupos da população guineense (mancanhas e mandingas, em especial) incidem em geral na figura e na acção de António Indjai - mentor do golpe e, embora de forma dissimulada, comandante operacional do mesmo.

Descrito como “homem forte” da Guiné-Bissau, constata-se, porém, que exerce tal papel de forma considerada “perigosa” (consciência tribal; noção primária do poder; mente desconfiada), o que não só acentua as reservas internacionais em relação à actual situação, como representa uma ameaça permanente de instabilidade.

A “quarentena” a que no seguimento do golpe Kumba Yalá foi votado, por vontade de A Indjai, destinou-se a retirar-lhe notoriedade como chefe tribal. Idem em relação à reclusão em que mantém Bubo Na Tchuto, o qual acrescidamente vê como rival militar (sentimentos que antes o levaram a conspirar contra o Alm Zamora Induta).

A Indjai, exige pronunciar-se sobre todos os actos das novas autoridades – mesmo os mais elementares.As próprias nomeações devem merecer a sua aprovação prévia. Há relatos segundo os quais “destratou” Serifo Namadjo ao saber que o mesmo tinha dado posse a 21 conselheiros e assessores presidenciais nomeados sem a sua aprovação.

Na conduta de A Indjai também começam a ser notados sentimentos de desconfiança em relação à própria CEDEAO. Determinou acções de vigilância permanente sobre as forças da organização aquarteladas no Cumenré e vacila em mandar desocupar o quartel da Marinha, em Bissau, que deverá passar a ser usado pela CEDEAO.

4 . As razões que de facto o terão levado a afastar do poder C Gomes Jr, junto do qual manifestava amiúde lealdade pessoal e institucional agora considerada “fingida” (tal como aconteceu com os angolanos), também estão agora a ser objecto de análise – dada a falta de correspondência com a realidade das que invocou.

A ilação que está a ganhar forma é a de agiu por impulso de subliminares sentimentos de natureza tribal e de classe – eventualmente fundados em considerações como as seguintes:

- C Gomes Jr não é um nativo não genuíno, i e, não tem identidade ou conotação étnica (a sua progenitora é uma mestiça, filha de um antigo administrador português de Fulacunda, de nome Ramalho).

- Não só não participou na luta de libertação nacional, ele e toda a sua família, como permaneceu “do lado dos portugueses”; só tardiamente aderindo ao PAIGC.

A aversão a C Gomes Jr evidenciada por A Indjai também é remetida para a aplicação que o PM denotava no lançamento de um plano de reforma das FA, com base no qual os militares seriam na sua maior parte reformados. A sua conduta anti-droga também não era apreciada devido aos interesses que o negócio fomentou em meios militares.

AM 671