quarta-feira, 8 de agosto de 2012
O golpe de 12 de abril - a sua complexidade
"Prezado Compatriota Aly,
Agradecia o favor de publicar esta minha contribuição ao debate sobre a actualidade nacional, no seu blog. Muito obrigado. Um abraço fraternal.
O golpe de estado de 12 de Abril na Guiné-Bissau ocorreu num contexto sub-regional complexo, agravado pela crise político-militar no Mali que surpreendeu os observadores e analistas políticos mais perspicácios, por ter acontecido num pais que se considerava democrata e imune à este tipo de flagelo que, infelizmente, ainda gangrena a vida política em alguns países do continente africano tal como o nosso.
O Presidente de Côte D’ivoire, que assumiu o poder no seu pais nas circunstâncias dramáticas que todo o mundo sabe, acabava de ser eleito a presidência da CEDEAO, e não estava minimamente preparado para enfrentar, fora de seu pais, mais outros problemas e, ainda menos, dois golpes de estado, em países tão diferentes como o Mali e a Guiné-Bissau.
Ao solicitar este lugar de prestígio, o Presidente Ouattara pensava poder aproveitar deste trampolim para consolidar sua imagem de estadista e pacificador na sub-região e no plano internacional, e, sobretudo, ganhar a confiança de seus concidadãos, daqueles em particular, ainda numerosos, que não lhe reconhecem estas qualidades e virtudes. Ele e seu governo estavam longe de imaginar a magnitude e complexidade das tarefas que iriam surgir pouco tempo depois de ter obtido o maior reconhecimento e aceitação por parte de seus pares.
E, precisamente, esta impreparação e falta de conhecimento das realidades sociopolíticos na Guiné-Bissau e ausência de afinidade linguística e cultural com o nosso pais que vão, negativamente, incidir sobre a solução preconizada ou imposta por alguns membros influentes da CEDEAO para sair da crise no nosso pais.
A priori, o Presidente em exercício da CEDEAO, o Presidente Ouattara, não tinha nenhuma preferência política ou simpatia para um ou outro protagonista da crise guineense. Logo no princípio, limitou-se a seguir as recomendações da estrutura política sediada em Abudja para, baseando-se nos princípios fundadores da organização sub-regional, veementemente condenar o golpe de estado e seus perpetradores, relembrando, de viva voz, a firme e inequívoca postura da CEDEAO de “tolerância zero” no que concerne tomadas de poder por vias inconstitucionais.
As coisas mudaram quando o Presidente em exercício da CEDEAO decidiu, por razões óbvias, concentrar-se sobre o Mali e deixar outros actores “mais avisados”, os vizinhos da Guiné-Bissau, o mais próximo em particular, “utilizar sua influência”, para facilitar uma saída de crise. Infelizmente, a esperada suposta mediação ou facilitação vai, rapidamente, transformar-se numa intempestiva e grave interferência, com a lamentável conivência de alguns compatriotas nossos. O resto é conhecido. Basta de lamentações! O momento é de, tirando as inevitáveis e dolorosas elisões, agirmos em conjunto, com seriedade, dedicação, humildade e determinação.
Hoje, o que se afigura imperativo é, indubitavelmente, a tomada de consciência por parte de todos os Guineenses da necessidade de voltarmos a ser donos do nosso destino comum, acabando, uma vez por toda, com o tratamento condescendente, vassalo e degradante de párias de que somos alvos por parte de certos países da sub-região.
Os problemas na Guiné-Bissau são criados pelos próprios Guineenses.
Nenhuma organização, instituição ou força estrangeira vai conseguir resolver as nossas contradições internas, as nossas fúteis rivalidades, inimizades absurdas e os nossos comportamentos vaidosos. Chegou o momento de procedermos a uma introspecção e meditarmos sobre o nosso futuro imediato. E preciso que reflectirmos, profundamente, serenamente, sobre este pais que se chama a Guiné-Bissau, o nosso pais, a mãe pátria, a vida em comum, num território que, embora pequeno, tem espaço e riquezas suficientes para todos nos e as gerações vindouras.
Mas é preciso que aprendamos à admitir, ouvir e respeitar opiniões diferentes ou mesmo divergentes, à partilhar e gerir aquilo que é o bem comum, que acabemos com o clientelismo, o sectarismo, a exclusão. Sim é preciso que se cria oportunidades para todos e que, juntos, defendamos a vida humana e exaltando os valores de trabalho, disciplina, honestidade e mérito.
E preciso que inventemos e adoptemos uma nova maneira de pensar e de conviver, uma nova cultura política que admita a competição, o debate contraditório e programático, o recurso a cidadãos qualificados, competentes, todos eles (as), para constituir a máquina, a locomotiva que vai empurrar o nosso pais para a frente, rumo ao progresso e desenvolvimento. A crise na Guiné-Bissau, embora cíclica, não é uma fatalidade. A solução definitiva esta ao nosso alcance. Temos recursos humanos suficientes, homens e mulheres valiosas para pensar, imaginar, conceber, conceituar, inventar, propor uma alternativa douradora.
O actual governo de transição, pela forma como foi constituído, arrancou com “chumbos nas assas” e, claramente, não tem capacidade para corresponder as expectativas e tão pouco pode responder aos enormes desafios que o pais enfrenta, porque não tem legitimidade e sustentabilidade. Não pode continuar. Estamos pois, todos nos, num impasse. O realismo deve prevalecer e nos conduzir a procurar uma solução pragmática e consensual. Comunicação, concertação, consultas, colaboração, consenso, sim consenso, são hoje em dia as palavras-chaves que devem, para preservar os superiores interesses do povo guineense, entrar no novo léxico e servir de “vade mecum” da vida política na Guiné-Bissau.
O PAIGC, partido maioritário no parlamento, tem toda a legitimidade para voltar a dirigir o governo. Um governo que crermos inclusivo e solidário: Um governo de UNIDADE NACIONAL.
Um governo de compatriotas de reconhecida competência, devoção, honestidade, isenção, HUMILDADE. Um governo cujos membros não abusam do bem público e respeitam o povo que tem por obrigação de servir com abnegação. Um governo legal que, pela sua composição abrangente, seu programa lúcido e seu roteiro realista, vai conduzir os destinos da nossa querida Guiné-Bissau, pacificamente, consensualmente, harmoniosamente, exemplarmente, criando todas as condições materiais, técnicas e politicas para a realização de eleições transparentes, justas, credíveis e incontestáveis.
Um governo que, rapidamente, vai dar uma nova esperança e dignidade ao nosso martirizado povo, galvanizando e federando todas as energias, do mais novo ao mais velho dos cidadãos da nossa querida terra, do norte ao sul, do leste ao oeste, do nosso belo pais, e reconquistar o respeito e a confiança dos nossos parceiros internacionais do desenvolvimento. Um governo responsável que saberá, de maneira intransigente, exaltar e honrar o mais importante, o mais sublimo, uma só causa, a mais justa, a mais nobre, a única que vala a pena defender até a morte a NOSSA PATRIA AMADA.
Nuno C."