sábado, 9 de abril de 2016

PAIGC: Reacção ao Acórdão 3/2016 do STJ


Militantes e dirigentes do PAIGC
Camaradas,
Senhoras e senhores membros e dirigentes de partidos irmãos,
Coletivo de advogados da Comissão Permanente da ANP e do PAIGC,
Agentes e Profissionais da Comunicação Social
População Guineense


Vejo nas vossas caras o que vos vai na alma – repulsa, indignação e ansiedade. Tenho consciência de que é o que sente a grande e esmagadora maioria dos guineenses, no país e na diáspora. Vos digo que têm razão, mas peço tranquilidade, paciência e confiança que nós vamos resolver a situação.

Mas antes de chegarmos ao problema e como vamos o resolver, tentemos explicar o que aconteceu e aonde estamos?

O Supremo Tribunal de Justiça, instância máxima do poder judicial guineense acaba de se pronunciar sobre dois pedidos de fiscalização da constitucionalidade, requeridos respetivamente pelos deputados substitutos e pelos deputados expulsos do PAIGC.

O país aguardou com redobrada espectativa e a esperança de ver esclarecidas todas as dúvidas de interpretação do nosso ordenamento para desbloquear o funcionamento de tão importante órgão de soberania como é a ANP.

Apesar de convencidos da validade do nosso argumento e por isso convictos de uma decisão favorável e que permitiria confirmar a reconstituição da nossa bancada parlamentar e assim se conformar com os resultados eleitorais registados nas urnas aquando das últimas eleições legislativas, nos preparamos para aceitar qualquer veredicto e dizer, está decidido, há que virar a página e seguir em frente.

Preparamo-nos para reconhecer que esta paralisia politico institucional já dura há demasiado tempo e portanto até uma meia solução seria válida e aceitável para não prolongar mais o sofrimento de todo o nosso povo e o já quase desespero da comunidade internacional parceira.

Ademais, o primeiro pronunciamento do Supremo Tribunal de Justiça em relação a esta crise (ver acórdão 1/2015), foi de uma clareza e contundência que, para além de nos ter granjeado a todos uma enorme respeitabilidade e admiração pelo mundo, fez subir a nossa crença na sua capacidade de se transformar num alicerce para a reconstrução do nosso edifício do direito constitucional e político. Além disso, criou as bases para clarificar e desbloquear qualquer situação de impasse governativo durante a corrente legislatura – O PAIGC é o vencedor das eleições com maioria absoluta, só a ele compete a governação do país nesse período;

Ter-se-á passado algo entre essa altura e o presente momento, para que a mesma instância, o nosso STJ se considere incapacitado e incompetente para assumir as vestes de Tribunal Constitucional da Guiné-Bissau e proceder à sindicância politica de algumas matérias não de outras em função das circunstâncias. Dizer simplesmente quem tem razão e como se deve proceder. O pronunciamento do Supremo Tribunal de Justiça nos remete de volta ao hemiciclo e ao eventual conflito de direitos já vivido no dia 18 de janeiro passado.

Perguntamos, mas afinal quem deve reter os 15 mandatos em disputa?

O acórdão nos responde que só a plenária da ANP pode auferir e decidir. Perguntamos se os 15 em questão tomam parte nessa decisão, e nos respondem (não pelo acórdão) que é um “princípio geral de direito” que ninguém é juiz em causa própria. Ora eis a única razão porque estamos desiludidos e preocupados.

A decisão parece remeter-nos para a situação anterior de bloqueio de um importante órgão da soberania.

Lamentamos porque esperávamos mais clareza e mais contundência na decisão, outros dirão maior pedagogia e a fixação da jurisprudência. Esta luta não devia valer pelo perpetuar desta batalha legal e juridica mas por se encontrar uma clarificação das regras de jogo, abrindo caminho ao exercício de todas as opções de entendimento possíveis e favoráveis ao funcionamento das instituições da República.

Para os mais interessados nos aspetos formais da decisão, eis algumas passagens da argumentação dos requerentes e que consta do acórdão:

Artº 83 nº 2 da CRGB - “ o deputado que falte gravemente aos seus deveres pode ser destituído pela ANP” mas esse preceito não se aplica quando o deputado se limita a votar livremente de acordo com a sua consciência e com o que ele considera mais adequado para o país... (presumivelmente, entra nesta lista do mais adequado para o país o chumbo do programa do seu governo, anteriormente votado por unanimidade e que levou ao compromisso de Bruxelas e à mobilização dos recursos financeiros anunciados)

... o Deputado responde politicamente e, eventualmente até mesmo disciplinarmente, se bem que a nível puramente interno, perante o seu partido ou perante o seu grupo parlamentar, sendo pois concebível em teoria que a violação da disciplina de voto possa dar lugar a afastamento do grupo parlamentar onde se integra; porém, mesmo nesse caso o deputado expulso não perderá o seu mandato (então?, se pode ser sancionado pela sua bancada parlamentar e não pode ser independente, com que estatuto pode permanecer na ANP);

É entendimento unânime dos ilustres constitucionalistas Portugueses... (J. Miranda, J. G. Canotilho, V. Morreira)...
Deputado que entra em conflito ou rutura com partido por que foi eleito vá reforçar qualquer outra formação política, tendo de permanecer como deputado independente. Por identidade de razão, não poderá integrar-se em nenhum grupo parlamentar o deputado que, sem deixar o partido (?), abandonar o partido por que foi eleito (evocação do estatuto de deputado independente);

O facto de não existir uma previsão legal expressa da figura do deputado independente, não implica necessariamente que um deputado sem partido não possa permanecer na ANP – “a questão não é essa, mas sim o facto de se ter abolido expressamente essa condição de deputado independente para reforçar o nosso sistema democrático partidário” (lei n.º 1/2010 de 25 de Janeiro).

Decisão:

... por tudo quanto se deixou exposto, os Juízes Conselheiros, em plenário do Supremo Tribunal de Justiça, decidem declarar a inconstitucionalidade material e formal da Deliberação N.º 1/2016 de 25 de Janeiro, da Comissão Permanente da Assembleia Nacional Popular, com força obrigatória geral – artigo 126º nºs 3 e 4 da Constituição da República.

Conclusões:

Lembrar-se-ão que há pouco tempo alguém nos dizia que cumpriu com o acórdão 1/2015 e espera que quando não for favorável aos outros que também cumpram. Podem estar á vontade pois para nós o cumprimento das leis e das deliberações de órgãos competentes não é uma opção, é uma obrigação.

O que eventualmente nos entristece e desilude é que nem todos se comprometam com o desbloqueio da situação do país e o funcionamento das instituições. O grande mérito do acórdão 1/2015 não foi o de dar razão a uma das partes, mas o de apontar o caminho para desbloquear permanente e definitivamente a situação política e a governabilidade do país;

A decisão da Comissão Permanente era a via para viabilizar o respeito do acórdão n.º1/2015 pois doutra forma veremos alterado em substância a constituição das bancadas parlamentares na ANP, veremos mascarada a verdadeira pertença dos deputados às bancadas parlamentares ou sancionaremos a existência de deputados independentes no nosso hemiciclo e consequentemente ao bloqueio do nosso sistema politico e do país.

O PAIGC assume o respeito do presente acórdão através da sua bancada parlamentar e exorta a ANP ao seu cumprimento escrupuloso sem prejuízo de um eventual requerimento ao STJ para a clarificação dos aspetos que suscitam duvidas ou contradições com o acórdão n.º 1/2015;

Reconhecemos que com esta podemos voltar ao ponto de partida fazendo o país perder mais tempo e bastante mais recursos e esforços, mas é ao que nos obrigam, e talvez sirva para um esclarecimento mais definitivo e conclusivo.

Testemunhamos manifestações de jubilo por desafiar o seu próprio partido na praça publica;

Constatamos a associação do segundo maior partido nessa manifestação – isso só pode significar uma perda de visão sobre a sua responsabilidade política – a essência da existência dos partidos políticos e do nosso edifício político está atingido, e ameaça a todos – isso só pode resultar de alguma ignorância ou o facto dos 15 já pertencerem ao PRS;

Lamentamos verificar que se reserva ao PAIGC, de forma exclusiva, a competência e a responsabilidade de criar as condições de viabilização a governação e governabilidade do país.

Poncius Pilato aqui não nos salva. Os órgãos não decidem a favor do seu próprio bloqueio ou pelo bloqueio ou contraposição das suas próprias decisões.

Aos militantes e dirigentes do PAIGC, deixo aqui claro que nos próximos dias e semanas, convocaremos os órgãos superiores (Bureau Politico e Comité Central nomeadamente) para uma orientação politica face ao atual contexto e garanto que criaremos todas as condições necessárias para que os militantes em liberdade absoluta se possam pronunciar e escolher o caminho a seguir – a firmeza e determinação na defesa dos seus princípios ideológicos e estatutários (o que significará a renovação da confiança na minha visão e atual condução do partido) ou a inversão, para o qual se terá de procurar outras soluções.

Enquanto merecer a Vossa confiança, renovo e concluo o que sempre prometi a todos os militantes do PAIGC: Nós respeitaremos as leis e as deliberações superiores mas ninguém será capaz de suprimir os direitos conquistados nas urnas e de forma democrática pelo nosso grande partido e pelo nosso povo.

Viva o PAIGC
Viva os Partidos Democráticos
Viva a Guiné-Bissau!