Este editorial é dedicado ao Povo da Guiné-Bissau
“O que é feito da Esperança?”, perguntei ao meu interlocutor, um amigo de infância. «Esperança» podia ser uma namorada dos idos tempos do liceu Kwame N'krumah ou uma amiga. Mas amiga daqueles bons velhos tempos de Bissau, diga-se de passagem. “Ora, ora”, replicou abanando o porta-chaves forrado de couro e onde se podia ler «jah glory». “Lembras-te da irmã, a Arrogância?”, perguntou entusiasmado. Não fazia ideia nenhuma, pois desde que regressei a Bissau pela primeira vez, em 1998, depois da saída para o ‘exílio', em 1992, que não me tenho cansado de, pelo menos, tentar saber dela. Em vão. Pois bem, agora ficarei a saber - pensei. Porém, estava longe de imaginar a resposta. “A irmã dela fez-se seca e agreste” – disse o Carlos, apontando de seguida o indicador direito para as acácias ‘avermelhadas' pelo pó, das ruas de Bissau. Contudo, sossegou-me. “Nunca casou”. Mas, e a Esperança? - insisti.
Eu queria saber era da Esperança, daquela que ouvia na boca dos alunos do liceu. “A Esperança engordou muito” – acompanhou tudo com um gesto. E continuou. “Teve um cabaz de filhos, cada um de seu pai” - aqui, resmungou. “Depois, deixou-se ir”, disse entristecido. Nessa altura os nossos olhos brilharam. E foi com eles fitos no chão que lhe ouvi dizer que os filhos da Esperança “andam por aí, pelo mundo, ninguém sabe. Nunca se entenderam, de resto”, disse acabrunhado. A Esperança está talvez condenada a naufragar – disse, tentando confortar Carlos. Lembrei-lhe ainda que ela herdara a alcunha do pai, que nasceu numa longínqua paragem, a que o desgaste da vida acrescentava uma velhice precoce. Abraçamo-nos e atravessamos a rua em direcção ao bar «Noé». Na esquina do passeio, uma acácia, pese embora sufocada pelo sol abrasador, irradiava um verde em todo o seu esplendor. E era capaz de dizer que os ramos mais altos se agitaram, como que a sorrirem para nós. Será a Esperança a chegar? Pensei então que caíssem cometas, desabassem o infinito e o inferno e este povo continuará, sereno, dando a sua lição ao mundo «civilizado» - assim mesmo e sem medo da expressão.