Lusa
O corte ilegal de árvores na Guiné-Bissau já está a afetar também as "florestas sagradas", disse à agência Lusa o membro de um grupo que lançou uma petição na Internet contra o abate. "Estão a ser dadas autorizações de corte e licenças para corte em florestas sagradas", zonas protegidas por usos e costumes das comunidades locais e geralmente abrigo de espécies de fauna e flores raras, explicou Miguel Barros, do Movimento Ação Cidadã, sediado em Bissau.
Apesar das denúncias feitas desde 2012, madeira de todo o país acaba em contentores e é exportada por via marítima e terrestre, sem regras, nem controlo, para benefício de alguns negociantes, alerta o grupo e um número crescente de organizações internacionais.
De acordo com o Movimento Ação Cidadã, as "florestas sagradas" já foram invadidas na região de Quinara, sul do país, no final de 2013, e nas imediações dos parques naturais de Cufada e Cantanhez, também no sul, no primeiro trimestre deste ano. Os "tronqueiros", nome dado pela população aos homens de motosserra que abatem a floresta, surgem com autorizações e guardados por militares ou outras forças de segurança do Estado e os habitantes pouco ou nada podem fazer para os impedir de entrar nos seus próprios terrenos.
"Resta a denúncia a larga escala", referiu Miguel Barros, para justificar a petição lançada na Internet - disponível na plataforma www.avaaz.org com o título "Parem imediatamente o tráfico ilegal de madeira na Guiné-Bissau". "Se as próprias autoridades de transição [Governo e outras instituições do Estado] vêm lamentar-se do que se passa, quer dizer que há uma total desresponsabilização", concluiu.
A petição tem como objetivo fazer com que o Presidente da República e Governo recém-eleitos na Guiné-Bissau suspendam todo o corte de árvores e façam uma avaliação da situação atual - com uma moratória que impeça a exploração de pau-de-sangue (madeira mais procurada) por 10 anos. Pede-se ainda "um inquérito ao tráfico ilegal de pau-de-sangue e outras árvores exóticas no país em particular nas áreas protegidas, florestas comunitárias e florestas sagradas".
Na mesma petição apela-se ainda ao Presidente da China que "assuma a sua responsabilidade na destruição das florestas dos países em desenvolvimento onde tem estabelecido parcerias de cooperação" - tema para o qual é pedida a atenção das Nações Unidas. Os níveis "sem precedentes" de destruição da floresta e de outros recursos naturais da Guiné-Bissau já foram motivo de alerta no Conselho de Segurança das Nações Unidas.
Em causa estão licenças de exploração emitidas pelo Estado em que "o país não ganha nada" e a população, maioritariamente dependente da agricultura, "fica com os ecossistemas destruídos", denunciou também à agência Lusa Nelson Dias, representante da União Internacional de Conservação da Natureza (UICN) em Bissau. Além da petição lançada pelo Movimento Ação Cidadã, outras têm sido criadas desde o início do ano, por iniciativa individual, na Internet, bem como diversos alertas nas redes sociais.
O Presidente eleito da Guiné-Bissau, José Mário Vaz, prometeu a 26 de maio rever todos os contratos relacionados com a exploração de recursos naturais do país, "doa a quem doer". O Presidente da República assume funções na segunda-feira, dia 23, cerimónia após a qual poderá dar posse ao primeiro-ministro, Domingos Simões Pereira, e ao Governo.