segunda-feira, 15 de julho de 2013

CARTA ABERTA ÀS NAÇÕES UNIDAS (NU), UNIÃO EUROPEIA (UE), UNIAO AFRICANA (UA) E A COMUNIDADE INTERNACIONAL (CI) EM GERAL


"Sobre a crise guineense, ouvem-se hoje com particular insistência manifestações de satisfação pelo facto de, na Guiné-Bissau se ter formado um governo, dito "inclusivo" e se ter já marcado a data das eleições gerais para novembro próximo. Nada de mais falso e ilusório caso nos atrelemos a essas falsas premissas como sendo a melhor solução para uma saída da crise nesse pais.

A formação recente de um novo governo dito de "inclusão" e a marcação da data das eleições gerais para novembro próximo, para nos, não constitui em si, nem de perto, nem de longe a solução para os problemas que neste momento assolam a Guiné-Bissau. Quem erradamente assim pensar, assacara inevitavelmente das suas consequências a curto prazo, pois o problema na Guiné-Bissau não reside no imediato, na realização ou não de eleições democráticas.

Eleições democráticas, sempre se realizaram na Guiné-Bissau, e o Povo sempre deu mostras da maior exemplaridade de civismo e maturidade politico-democrática. Dai concluirmos que os problemas encontram-se algures e são alheios ao processo do exercício eletivo dos nos nossos dirigentes.

A pervalecer a logica da realização "imediata" das eleições gerais na Guiné-Bissau, é nossa convicção de que:

1 - Com a manutenção da atual estrutura do poder político-militar reinante na Guiné-Bissau, principalmente a cúpula castrense, é certo de que, tudo o que se possa fazer num sentido ou noutro para restaurar a ordem democrática, é mera perda de tempo e desperdício de dinheiro. Esse binómio de poder reinante já deu mostras suficiente de que, só deixarão aceder ao poder aquele (no caso das presidenciais) ou aqueles (no caso das legislativas) que se aprestam a corresponder aos seus comandos de impunidade e se submetam as suas praticas delinquentes e criminosas até hoje reinantes. Para se aferir disso, basta lembrar as palavras do omnipresente general António Indjai que, publicamente já indicou quem pode candidatar-se e quem deve ganhar as eleições na Guiné-Bissau a seu gosto. As suas palavras são explicitas em toda a linha e não deixa espaço a quaisquer equívocos. Como se sabe quem manda hoje na plenitude em toda a Guiné-Bissau é o general, sendo que a sua vontade fazem força de lei com respaldo até nas ultimas instâncias da Republica;

2 - Se se mantiver em funções na Guiné-Bissau o atual governo pomposamente apelidado de "inclusivo", é por demais evidente de que, não estarão reunidas as condições minimamente tangíveis para a realização de um escrutínio bem organizado baseado na competência e transparência para que as mesmas venham a ser caucionadas como sendo "livres, justas e transparentes". O atual regime politico guineense, esta claramente refém dos militares pois trata-se de uma emanação clara dos desígnios dos militares golpistas que efetivamente detém o poder na Guiné-Bissau, os quais sem darem a cara continuam na sombra a manipular diretamente toda a ação presidencial e governativa do pais. Por outro lado, a composição pletórica do atual elenco governativo é demostrativo de que, o atual executivo, em vez de se assentar exclusivamente num pragmatismo de governabilidade e de responsabilização inerente à gestão corrente dos assuntos do Estado e a preparação das eleições previstas para novembro próximo, digladiam-se em partilhas de centros de interesses e em guerras estéreis para o abocanhamento das melhores parcelas do erário publico. Os atuais governantes irão concentrar-se nestes cinco (5) meses de governação, todas as suas atenções e ambições na guerra dos postos e no açambarcamento das melhores "fontes" de rendimentos do Estado para assim, poderem desvia-los para os seus bolsos e interesses particulares. Nenhum dos governantes da atual transição (PRS, PAIGC golpista e Pequenos partidos apoiantes do golpe), presidência da republica incluída, se vê centrada nos ideais do interesse publico e nem na procura do bem comum, porquanto todas as atenções das personalidades do atual regime golpista esta centrada no pecúlio das suas ações de rapina neste período de transição, deixando a problemática das eleições nos corredores do esquecimento;

3 - Com a atual estrutura da Comissão Nacional de Eleições (CNE), não existem as condições mínimas para se garantir a realização de eleições tecnicamente competentes e muito menos que estas venham a merecer a caução de "livres, justas e transparentes". A atual estrutura dirigente da CNE esta neste momento completamente descaracterizada e sem legitimidade para quaisquer caucionamento eleitoral, porquanto foi tomada de assalto por interesses mesquinhos de partidos e é regularmente alvo de interferências da cúpula militar em particular do general Indjai que, contra toda a logica legal e estatutária tem advogado com insistência a imposição do atual Secretario Executivo, António Sedja ao posto de Presidente da CNE. Esta controversa personalidade, para além da sua já reconhecida incompetência, impreparação técnica e inabilidade politica para dirigir esse prestigiado órgão, tem igualmente a seu desfavor o seu enraizado enfeudamento as diretrizes do seu partido, o PRS e à sua inegável cumplicidade e servência para com a cúpula militar golpista. Esse fatores desqualificam-no como sendo eventualmente capaz de levar a bom porto qualquer processo eleitoral, e muito menos, este que se prevê, potencialmente carregado de controvérsias e litígios. A tudo isto, acresce que os sistemáticos bloqueios que têm sido levantados pelo PRS à nomeação do novo Presidente da CNE dentro do quadro legal vigente, representa igualmente um mau pronuncio sobre a necessária garantia de imparcialidade e apartidarismo que se exige a este órgão eleitoral. No contexto atual, suscitam-nos duvidas de que a CNE, tal como está, esteja à altura de assegurar esse desiderato legal;

4 - A manutenção em funções do atual "entende" politico militar (Presidente de Republica de Transição e o seu Governo de Transição com o Comando Militar) saído do golpe de estado de 12 de abril de 2012 afasta a partida, toda e qualquer possibilidade de existirem as condições mínimas para a realização de um processo de transição que desemboque em eleições, claras, coerentes, livres e transparentes segundo as normas e os princípios democráticos modernos exigidos pela comunidade internacional. O atual regime politico reinante em Bissau, assim como todas as estruturas de relevância publica encarregues do processo de transição estão enclausurados e submetidos às orientações e diretrizes que emanam dos interesses e estratégias do real detentor do poder na Guiné-Bissau, o general Antonio Indjai, figura poderosíssima, que na realidade manda a seu bel prazer na Guiné-Bissau apesar de ser alvo de ações judiciais graves, impendendo inclusivamente contra ele um mandato de captura emitido pelos Estados Unidos da América (EUA);

5 - Caindo as NU e a CI no logro de deixar manter-se o status quo político-militar vigente na Guiné-Bissau, NADA garante que, caso se realizem as eleições, tal como exigem sofregamente as NU e a Comunidade Internacional (CI), os resultados dos mesmos venham a ser aceites e respeitados pelos atuais detentores do poder, particularmente os militares. NADA de NADA é certo nesse sentido, porquanto o passado recente das eleições de março 2012 não auguram melhores pensamentos, pois continuamos a pensar que, o atual regime de Bissau só estará disposto a aceitar os resultados que lhes convier e que se submetam aos seus ditames. Quanto aos preferidos dos militares creio de que estamos perfeitamente elucidados.

Posto estas considerações de sobreaviso, julgamos de justificada prudência, que as NU, a UA, a UE, a CPLP e a CI no seu geral, se cuidem para com as exigências e condições que deve impor ao regime de Bissau para o processo de transição com vista as eleições gerais previstas para novembro próximo. Entendemos que, restringir-se simplesmente à exigência da realização de eleições gerais, como condição sine qua non para reposição da legalidade democrática parece-nos extremamente redutor e singularmente perigoso para a abordagem de um problema tão complexo quanto é a atual conjuntura político-militar na Guiné-Bissau.

Do nosso modesto ponto de vista, julgamos que seria mais logico e coerente, fazer-se desde já um ponto da situação atual que está neste momento já em clara derrapagem exigindo-se correções urgentes e praticas, as quais devem basear-se em regras e compromissos claramente definidos as quais serão consubstanciadas em condições sine qua non para que se dispensem os apoios financeiros e material para a realização das eleições gerais próximas.

Para isso:

Em primeiro lugar, deve-se exigir a restruturação do atual executivo, impondo-se-lhes um organigrama de governo restritivo confinado à gestão corrente do Estado, mas essencialmente virado, à preparação e organização das eleições gerais. Para isso, deve-se igualmente traçar o perfil dos potenciais governantes (de preferência quadros reputados e tecnocratas que não tenham passado em executivos anteriores) e fixar as respetivas quotas de inclusividade governativa que deve ser de acordo com o respaldo que emana da representatividade na ANP.

Em segundo lugar, exigir-se a reforma ou a substituição total da atual chefia militar e demais cadeias de comando militar, assim como impor-se-lhes a assunção formal da obrigatoriedade de se submeterem ao poder politico e as leis da Republica, contribuírem de forma construtiva pelo respeito dos resultados eleitorais e não se envolverem em quaisquer situações de perturbação ou de contestação dos resultados saído das eleições sob pena e consequência de serem submetidos à jurisdição penal internacional ;  

Em terceiro lugar, as NU, a UE e a UA em particular devem-se envolver diretamente e a vários níveis em todo o processo de organização, condução e supervisão do processo eleitoral. Significa isso que, esses organismos devem criar e instalar ao nível da CNE células ad hoc, vocacionadas, quer para o apoio e seguimento do processo eleitoral e, principalmente uma célula de supervisão externa que possa garantir a requerida isenção e idoneidade do escrutínio, assegurando assim o necessário cunho de caucionamento de umas eleições "livres, justas e transparentes". Estamos certos de que, sem a implementação a nível da CNE destes mecanismos de monitorização, controlo e validação externos suportados pelas NU, a UE e a UA, os resultados eleitorais poderão ser facilmente adulterados sendo particularmente orientados segundo os interesses da omnipresente classe militar (exemplo disso foi recentemente dado pelo atual SE da CNE aquando da primeira volta das eleições de maio de 2012, quando sob instruções do seu partido, o PRS, veio, a revelia de tudo e de todos anunciar de que, Kumba Yala tinha ganho as eleições presidenciais de março 2012, logo à primeira volta,).    

Em suma, se as NU e os demais principais parceiros da Guiné-Bissau persistirem na imposição da realização das eleições em novembro próximo sem que essas condições previas acima enunciadas não sejam minimamente acauteladas, pensamos nós, cometer-se-á um erro crasso cujas consequências desastrosas ninguém poderá neste momento equacionar, senão a certeza de que, não é a melhor solução na presente conjuntura para a Guiné-Bissau.

Assim, do nosso humilde ponto de vista supomos de que, mais vale ponderar com atenção a implementação das premissas e condicionantes acima expostas e optar-se por um caminho e calendário mais seguro, realista e exequível. Pensamos que, mais vale assim, do que forçar a situação vislumbrada pelas NU e a CI, pois perante a malha de incertezas e fecunda instabilidade que neste momento assola a Guiné-Bissau, correm-se sérios riscos de "deitar dinheiro pela janela fora", deixando o pais a mercê da lei do mais forte.

Os nossos destinatários sabem perfeitamente para que lado pende a balança do mais forte neste momento na Guiné-Bissau e, caso insistam estamos aqui prontos para voltarmos ao debate sobre este assunto, pois novembro fica à porta.

Que Deus abençoe a Guiné-Bissau.

Coletivo de Reflexão "Nô pensa Guinendadi"