domingo, 16 de agosto de 2009
Presidente Prozac?
“N.,
Obrigado pelas tuas palavras (tomei boa nota).
Antes de mais, um lead para esclarecer:
- Eu não ganhei a vida que levo, ao contrário do que escreveste – escolhi-a. Uma vida espartana, quase banal. E no entanto, não estou minimamente arrependido das escolhas que fiz. Adapto-me bem a qualquer situação, em qualquer lado. E que merda de vida eu levo!
Nha ermon,
O teu problema, eu sei, é outro. É este Presidente que vocês elegeram! Mas também o Governo (e não sei se o parlamento...).
Amigo, começo com o Governo. Existem três formas de governar - contra uns, contra todos ou contra ninguém. O teu primeiro-ministro começou mal: perdeu-se, engordou o Executivo como nunca se viu e, depois, não conseguiu encontrar o meio-termo. E depois? Bem, depois escolheu a via da confrontação. Começou por confrontar uma pessoa, depois confrontou mais uns quantos e agora está a confrontar toda a gente ao mesmo tempo. Isto, até que lhe confrontem. Não maina. I ta tarda nan son.
Quanto ao presidente eleito:
No próximo dia 8 de Setembro, a Presidência da República conhecerá um novo inquilino. É indesmentível (mesmo que para muitos seja inconfessável) que todo o País (e não apenas os 63% que elegeram Bacai Sanha) aguarda com expectativa.
Para trás, ficam quatro anos de uma presidência sempre no fio da navalha, fruto da eterna desconfiança cultivada, do ódio enraizado. Entraram em 1973. Eles – os desgraçados - e as suas armas.
Em contraponto com este período de acentuado e penoso declínio, ou talvez precisamente por causa dele, Bacai Sanha chega à Presidência como símbolo de uma ‘renovada esperança’. Dele se espera que cumpra muitos dos sonhos que os guineenses nunca sequer sonharam. Dele se espera que, mais do que uma colaboração construtiva com o primeiro-ministro, que seja o verdadeiro inspirador e mentor da acção governativa deste. Dele se espera, ainda, que seja uma reserva de bom senso e um farol da arte de bem governar.
Porém, qualquer aprendiz de ciência política compreende que o Presidente guineense não tem, pura e simplesmente, margem constitucional para almejar tamanha responsabilidade. Imaginar o contrário, meu caro, seria de uma ingenuidade desarmante.
Claro que a imbecilidade, por si só, não mata ninguém. O grave é que o sentimento é igualmente perigoso. Precisamente porque Bacai Sanha não será, não pode ser, a solução de que o País precisa. Funcionará, quando muito, como um temporário Prozac para a Nação: passada a euforia inicial, afastado durante algum tempo o sintoma, o País acabará inevitavelmente por se confrontar consigo mesmo. E como qualquer psiquiatra explicará, a depressão que se seguirá só pode ser mais severa e, em igual proporção, devastadora.
Mas nós somos mesmo assim: perversos. Temos aquela tendência reiterada para esperar homens providenciais. Temos talvez uma crença doentia num qualquer deus que projecta para fora de nós próprios a responsabilidade pelo nosso destino enquanto Povo. E a projecção não é mais do que a melhor garantia de que, no essencial, tudo continuará como dantes.
P.S. 1 - Uma coisa: quando morrer não vou para o céu (soube de fonte segura).
P.S. 2 – Outra coisa: Ontem, alguém com me cruzei por acaso disse-me: “Chegamos ao ponto de alguém desaparecer e ninguém ir à esquadra. Vão directamente aos hospitais e às morgues”. Como doeu! AAS