segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

EXCLUSIVO DC: Eis o homem que comandou o 'rapto' do traficante nigeriano das mãos da PJ


Ontem, dia 26 de Janeiro de 2014, no aeroporto internacional Osvaldo Vieira, uma equipa de agentes da Polícia Judiciária, abordaram um cidadão nigeriano de nome Ezekoka Chima, com o passaporte NºAO2989897, proveniente do Brasil, no voo da companhia aérea Royal Air Morroc, suspeito de ter transportado droga.

De seguida os agentes, depois de todas as formalidades, conduziram o suspeito para a viatura com destino as instalações centrais da PJ. Surpreendentemente e na presença da multidão que se encontrava na entrada do Aeroporto Internacional Osvaldo Vieira, os dois agentes que conduziam o suspeito foram invadidos por um grupo de polícias de Ministério do Interior, alguns fardados e fortemente armados, sob o Comando do Adjunto-Chede de Operações da Brigada da Intervenção Rápida (BIR), Mussa Nambatcha (VER FOTO).


MUSSA NAMBATCHA, Adjunto de Operações da BIR, foi quem resgatou o nigeriano traficante das mãos da Polícia Judiciária

O Grupo estava composto por mais de 15 homens, todos armados, e estavam em 5 viaturas. Os homens do BIR interpelaram os agentes com o suspeito, junto da viatura da PJ que se encontrava estacionada na parte exterior do Aeroporto. Os homens da farda azul agrediram os agentes em causa, na voz do Mussa Nambatcha, os agentes da PJ foram obrigados a entregar o suspeito.

Com a recusa por parte dos agentes da PJ, vieram um grupo de pessoas afectos ao Ministério do Interior e das Forças Armadas, que estavam de retaguarda, sob a ordem do Mussa Nambatcha, retiraram o suspeito, usando violência e ameaças de morte contra os agentes e levaram-no numa viatura Mercedez 190 cinza para um lugar incerto. AAS

NOTÍCIA DC - DROGA: O cidadão guineense que morreu no aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, Brasil, chamava-se Okica Oliveira, era filho de Ukus Na Mon, régulo de Casinatche, zona de Có. Vivia em Fortaleza e depois mudou-se para S. Paulo. A polícia fez, segundo apurou o DC, ligações a algumas pessoas em Fortaleza. AAS


NOTÍCIA DC: Cocaína mata cidadão guineense no Brasil


Um cidadão de origem guineense, morreu no aeroporto de Guarulhos em São Paulo (Brasil). A vítima preparava-se para viajar para Portugal, e morreu porque tinha engolido cápsulas de cocaína que rebentaram no estômago. após a confirmação do óbito, as autoridades policias pegaram no telemóvel da vítima e ligaram para os números para os quais ele tinha feito as últimas chamadas.

O pedido seria para fazerem o reconhecimento do corpo, mas nenhuma das pessoas contactadas compareceram - ou mostraram sequer disponibilidade para colaborar (todos se esquivaram). Ditadura do Consenso sabe que o malogrado tinha feito uma viagem para a Guiné-Bissau há bem pouco tempo... AAS

ELEIÇÕES(?) 2014: Perto de 5.000 guineenses já foram recenseados em Cabo Verde. AAS

Rui Barros com título de 'Doutor Honoris Causa'




Os anos na UEMOA compensaram.


PAIGC: Resolução Adulterada vs A Lei é Clara


Afinal, a Resolução lida ontem em voz alta - e aprovada no Comité Central - não faz qualquer alusão à substituição da Liderança da Bancada Parlamentar. O ex-lider Rui Diã de Sousa, apurou o DC de fonte fidedigna, choramingou perante o Comité Central e Manuel Saturnino da Costa emitiu a sua opinião pessoal. Não houve discussão e muito menos votação sobre o assunto.

Aliás, a Resolução original lida no Comité Central, não só não fez como também não podia fazer referencia à questão, uma vez que a matéria não constava da "Ordem do Dia. A alegada suspensão da eleição realizada na Assembleia Nacional Popular foi posterior e sorrateiramente aditada à resolução. Como foi introduzida às escondidas, acabou por ficar nas recomendações e não nas deliberações da Resolução. Assim sendo, parece que os Deputados se limitaram a tomar boa nota da recomendação...

Como a eleição da nova Direcção do Grupo Parlamentar foi realizada na sede da Assembleia Nacional Popular e sendo o acto da exclusiva competência dos Deputados (alínea a) do art. 53 dos Estatutos do PAIGC):,



com comunicação ao Presidente da ANP nos termos do n.º 3 do artigo 16º do Regimento, não se percebe como é que a opinião de um ainda que respeitável comandante pode, em democracia, impor-se à vontade da maioria absoluta, expressa em voto livre e secreto (dos 67 Deputados do PAIGC votaram 40, tendo a nova liderança sido eleita com 39 votos a favor e 1 abstenção).

Ora, sendo assim, Octávio Lopes mantém-se como Líder da bancada dos 'libertadores', pois foi votado pelos seus pares na casa da democracia - Assembleia Nacional Popular.

PS: Consta que a conferência de Oio, validada pelo Comité Central, também foi adulterada...AAS

OPINIÃO: Horta daninha


«O Gabinete das Nações Unidas (NU) na Guiné-Bissau deve estar a viver momentos únicos na história das missões que têm realizado um pouco de tudo pelos quatro cantos do mundo.

As peripécias e momentos de inusitado incomodo pela qual tem passado Gabinete da ONU de mediação da crise na Guiné-Bissau, pais sob custodia de militares e de narcotraficantes, de certeza absoluta, devem ser casos únicos em termos de experiência em teatros de conflito ou de mediação de crises.

Uma conclusão no entanto se poderá tirar desta caricata situação. Ela, devera servir para as NU como sendo uma variante importante de ponderação nos casos de avaliação de futuras escolhas de figuras que o representem, com dignidade e prestigio à altura da grandeza e respeitabilidade da organização.

ninguém pode e deve ficar indiferente aos momentos de desconforto e banalização a que o Gabinete das NU na Guiné-Bissau tem sido sujeito pelo regime militar de Bissau. Tudo isto, a meu ver, deve-se ao carácter, a personalidade e a postura de quem hoje dirige essa missão na Guiné-Bissau : o Nobel da Paz e ex-presidente Timorense, Jose Ramos Horta.

Este outrora Nobel da Paz, cuja nomeação ao posto de Representante Especial do Secretario Geral das NU (RESG-NU) para a Guine-Bissau, chegou a despertar no intimo dos guineenses e dos defensores da democracia, uma crença de pragmatismo, alimentando legitimas esperanças, de que, com a sua experiência e savoir faire, muito iria contribuir positivamente, para a resolução de mais um conflito que voltou a sacudir o pais. Infelizmente, foi sol de pouca dura. Cedo se deu conta do erro de casting e o fracasso rotundo que viria a ser a escolha desse supostamente tarimbado e calejado politico.

Passados os primeiros tempos de euforia, Ramos Horta, foi-se irremediavelmente perdendo nos jogos de labirintos enganosos de vitimização useira e vezeira dos narco-militares guineenses. Perdido no emaranhado do jogo de intrigas e falsidades, RH foi perdendo o rumo da sua missão e, com ele, foi arrastando penosamente a imagem e a respeitabilidade das NU pelas ruas do descrédito e da vulgaridade.

Suposto ser um elemento dissuasivo, o RESGNU, foi assistindo nas suas barbas, uma serie de atropelos aos direitos humanos, nomeadamente, espancamentos de políticos e civis, actos de tortura, raptos, assassinatos sumários ou encomendados, intimidações, repressões barbaras de manifestações publicas, interdição de actividades politicas de certas facções que se opunham contra o golpe de estado, prisões arbitrarias de políticos, membros da sociedade civil e dos defensores dos direitos humanos...enfim, um rol de arbitrariedades e de impunidades, foram se desfilando na sua presença, aproveitando-se os seus autores da ineficácia, inoperância e certa "cumplicidade" de quem, supostamente representa as NU no pais.

Aposto de que, nos anais da sua historia e experiência, as NU, nunca tiveram, uma representação tão inoperante, inútil e omissa, como a que esta instalada na Guiné-Bissau, o que demostra, a manifesta ligeireza e desrespeito com que o regime militar de transição trata e lida com o seu Representante na Guiné-Bissau, o qual, cada dia que passa, mais parece um turista despreocupado, do que um mediador de conflito.

E por estas razoes de vulgaridade, é que, as instalações das NU são invadidas e cercadas, o cortejo do RE mandado parar e revistado, que viaturas de funcionários da organização sejam seguidas, mandadas parar e revistadas indiscriminadamente, que seus colaboradores ou assessores nacionais sejam regular e gratuitamente espancados... enfim, é ver, toda a imagem da organização, ser sistematicamente, desrespeitada, vilipendiada, ridicularizada e humilhada pelas autoridades golpistas de Bissau.

Porem, não devemos esquecer, de que, tudo isto, teve um começo. Tudo começou, num certo dia do mês de abril, um dia que parecia, dia de mentira, soldados comandados por Antônio Injai, violaram e invadiram a sede das NU em Bissau, para libertarem Bubo Na Tchuto e darem um golpe de estado contra o Governo de Carlos Gomes Junior, beneficiando na altura com cumplicidade escamoteada do então Presidente Malam Bacai Sanha. Foi a partir desse inesquecível dia que as NU perdeu a sua "virgindade" e não reagiram à altura..., razão pela, hoje, qual uma galderia perdida, paga as favas da sua promiscuidade e condescendência para com os militares narcotraficantes que reinam hoje em Bissau.

O nosso saudoso Jose Carlos Schwarz cantou "si garandi di casa ta tchami, fidjus tudu ta nornori"

Demócrito
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DROGA no aeroporto


Um cidadão nigeriano proveniente de Marrocos no voo da companhia aérea Royal Air Maroc, foi detido ontem por agentes da PJ no aeroporto internacional Osvaldo Vieira de Bissau. O detido transportava consigo droga, facto constatado pelos referidos agentes.

Quando era conduzido para as instalações da PJ, os agentes foram interpelados por 15 elementos das Forças de Intervenção Rápida (FIR), resgatando o detido, o qual foi levado protegido pelas FIR, mais a droga, para parte incerta. Assim, vai a Guiné-Bissau: a PJ caça os malfeitores as FA e a FIR liberta os seus protegidos...AAS

domingo, 26 de janeiro de 2014

PAIGC: Na reunião de hoje, 'decidiu-se' pela continuidade de Rui Diã de Sousa como líder parlamentar do partido. AAS


PAIGC - CONGRESSO: Será desta?


O congresso do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde vai decorrer até domingo, dia 02 de fevereiro, na vila de Cacheu, no norte do país. De acordo com a mesma fonte, a decisão saiu de uma reunião do Comité Central, realizada ontem, em Bissau. Segundo esclareceu, já estão reunidas as condições necessárias para a realização do congresso, que tem sido adiado há mais de um ano devido a divergências internas sobre os estatutos e sobre a forma de escolha de delegados à reunião magna. o PAIGC precisava, segundo o orçamento a que o Ditadura do Consenso teve acesso, de pouco ais de 1 milhão de euros para realizar o seu congresso.

Mil e duzentos delegados vão tomar parte do encontro para eleger o líder do PAIGC que vai substituir Carlos Gomes Júnior, primeiro-ministro deposto no golpe de Estado de abril de 2012, após o qual saiu do país. Apresentam-se à corrida para liderar o PAIGC vários dirigentes: uns como candidatos ao cargo de secretário-geral (Domingos Simões Pereira, Aristides Ocante da Silva, Cipriano Cassamá e Daniel Gomes) e outros que concorrem ao lugar de presidente do partido (Braima Camará, Carlos Correia e Satu Camará).

Antes da votação para a nova liderança será escolhido qual o modelo de estatutos que vai passar a vigorar. Uma proposta sugere que o PAIGC passe a ter um secretário-geral que seja cabeça-de-lista do partido nas eleições legislativas, ou seja, candidato ao cargo de primeiro-ministro.

Nos estatutos em vigor até aqui, há um secretário nacional, mas apenas com funções administrativas, sendo que o presidente é quem dirige o partido politicamente, assumindo-se como cabeça-de-lista nas legislativas. Uma outra prevê que o presidente fique confinado exclusivamente às tarefas de organização, sem se apresentar aos cargos eletivos de Estado. LUSA/AAS

NOTÍCIA DC: Serifo chamuscado


A CEDEAO parece ter acordado da longa letargia, e associou-se finalmente à restante comunidade internacional no cerco ao presidente de ‘transição’, Serifo Nhamadjo, e contra os seus obscuros interesses. O ex-homem-de-mão da CEDEAO quer a todo o custo que as eleições sejam adiadas. Quer ser presidente – coisa que não pode, à luz dos acordos de transição.

Primeiro, pediu ao primeiro-ministro Rui de Barros que este se candidatasse ao posto de comissário da CEDEAO. A Guiné-Bissau tinha dois candidatos - Cacaio Casimiro, economista e Huco Monteiro, sociólogo, e que acabou por ser o escolhido. Há muitas interpretações acerca da candidatura do Rui Barros ao posto de comissário – que, sabe-se agora, nunca foi uma escolha sua e antes uma jogada do PR de ‘transição.

Como vingança por o Rui não ter acedido aos seus caprichos, Serifo tirou-lhe o tapete, exigindo - segundo fontes do DC bem colocadas – que assim sendo, Rui Barros também não poderá sair antes do fim da transição. A estratégia é simples: levar o Rui com ele no mesmo barco que está a meter água por todos os lados. Alguns pensam que é uma forma que Serifo Nhamadjo encontrou para afastá-lo, devido às divergências entre ambos – por todos conhecidas.

Ditadura do Consenso sabe, porém, que a ida de Rui Barros a Abidjan serviu para este cavar ainda mais a ‘sepultura’ de Serifo junto da organização sub-regional. Rui Barros fez finca-pé junto dos presidentes Ouattara e Johnattan, para que as eleições não fossem novamente adiadas, e quis levar garantias junto destes de que Serifo não podia candidatar-se. Disse o mesmo ao Ramos Horta, o representante de Ban Ki-Moon na Guiné-Bissau. AAS

Lala quema



FOTO DR: AAS/DC 2012

sábado, 25 de janeiro de 2014

Guiné-Bissau aquece entre camaradas


Guiné 63/74 - P12622: Notas de leitura (555): “Magrheb/Machrek – Olhares luso-marroquinos sobre a Primavera Árabe”, por Raul M. Braga Pires (Francisco Henriques da Silva)

O Raúl Braga Pires, de quem sou amigo, apesar de muito mais novo do que eu, conhece bem a Guiné-Bissau e escreve sobre a realidade bissau-guineense atual no seu blogue e no jornal “Expresso”. É bastante crítico, como a maioria das pessoas, ao que por lá se passa e dá-nos uma visão muito interessante e abrangente, relacionando a Guiné-Bissau com os acontecimentos na região, bem como com o que se passa no Sahel e no Magrebe, em geral.

O livro podia passar desapercebido devido ao respetivo título “Maghreb/Machrek - Olhares Luso-marroquinos sobre a Primavera Árabe” que nos leva a pensar tratar-se da abordagem de outras temáticas, mas não são só esses assuntos que Braga Pires menciona, a Guiné-Bissau aparece e vale a pena estarmos atentos ao que ele refere.

Com cumprimentos cordiais e amigos,
- Francisco Henriques da Silva
- Ex-Alferes miliciano de infantaria
- CCaç 2402 - Có, Mansabá e Olossato, 1968-1970
- ex-embaixador de Portugal em Bissau, 1997-1999


3. A errática Guiné-Bissau

Francisco Henriques da Silva

«Raul M. Braga Pires, politólogo, arabista, professor da Universidade de Rabat e investigador do Observatório Político em Marrocos, doutorando do ISCSP, edita com regularidade um blogue, também publicado no conhecido semanário “Expresso”, sobre assuntos do Médio Oriente e Magrebe, tendo dedicado alguma atenção à Guiné-Bissau, onde se deslocou váriasvezes. Lançou recentemente um livro “Magrheb/Machrek – Olhares luso-marroquinos sobre a Primavera Árabe” (Diário de Bordo, Lisboa, 2013), onde reproduz todos os textos que publicou no “Expresso” e no dito blogue. Após uma incursão pelo Norte de África, Médio Oriente e Sahel, ou seja o prato forte da obra, digamos assim, apresenta três capítulos (ou, se se quiser, 3 “posts”) relevantes e bastante informativos sobre a atualidade daquele pais lusófono oeste-africano, que, no seu entender, tem que ver com a evolução política e estratégica das regiões contíguas. Daí a sua inclusão. Depois de ler o que Raúl Braga Pires escreveu, elaborei uma pequena recensão, que complementei com outros elementos e com algumas reflexões da minha lavra.

O autor começa por se referir à “intentona/inventona” (?) de 21 de Outubro de 2012, classificando a situação como sendo “confusa” e considerando que “a realidade ultrapassa em muito a ficção”. Acrescentaria que estas classificações e considerações são quase eufemísticas perante o caos que é hoje a Guiné-Bissau e do qual teima em não sair. Braga Pires menciona a balantização do Poder político e militar (que, aliás, não é de hoje, mas que se terá acentuado com o “putsch” de 12 de Abril de 2012), em que Kumba Ialá emerge com ambições ao Poder (no meu entender e para que as coisas não aparentem ser tão óbvias, Kumba tem no terreno, como se sabe, gente sua e poderá controlar a situação de fora sem necessidade de grande exposição pessoal, manobra táctica que me parece óbvia). Menciona um sem-número de factos, bem como algumas suposições plausíveis, atenda-se ao contexto.

Em primeiro lugar, assistia-se – e assiste-se - a uma tribalização do poder político e militar, donde no conflito balantas-felupes, os primeiros levaram necessariamente a melhor. As danças e contra-danças entre as classes castrense e política, a promiscuidade generalizada sobretudo a este nível, são o que se adivinha e não valerá a pena pôr muito mais na carta. Carlos Domingos Gomes (Cadogo), PM deposto e frustrado candidato presidencial, continua a aspirar elevar-se um dia à cadeira do Poder. A actuação do capitão Pansau N’Tchama é no mínimo surrealista e as suas ligações a Portugal e à CPLP (leia-se Angola e Cabo Verde) abstrusas. O autor suscita as estranhas coincidências de ter chegado a Bissau com uma equipa de reportagem a escassas horas da “intentona/inventona” e da libertação de Pansau N’Tchama, com alegadas ligações a Portugal, ter precisamente ocorrido na véspera da sua partida.

Braga Pires faz uma análise do primeiro trimestre de 2013, salientando a chegada de Ramos Horta e a sua declaração algo desmedida ao considerar a “Guiné-Bissau como o país mais seguro da África Ocidental” (sic). O representante da ONU chega também num momento em que o PAIGC assina o Pacto de Transição e em que era já perceptível que o período transitório teria de ser necessariamente prorrogado. Neste quadro, há que tomar-se em atenção que o recenseamento biométrico da população não poderia ser feito durante a época das chuvas, o que levaria inevitavelmente a um adiamento das eleições. Apesar da descentralização anunciada e auto-elogiada pelo Governo, o autor põe em causa o recenseamento biométrico, efectuado sem grande publicidade nem campanhas de sensibilização junto da população. Neste contexto, acresceriam ainda enormes dificuldades de ordem logística e financeira. Tendo em conta os factores enunciados, o próprio PR admitiu a inevitabilidade de se prolongar o período de transição.

Ao referir-se à cimeira da CEDEAO (Comunidade Económica de Estados da África Ocidental), que a Guiné-Bissau integra, considera Braga Pires que “a solução da questão Norte do Mali/terrorismo estará sempre dependente duma resolução dos conflitos internos da Guiné-Bissau, ambos os países têm governos provisórios saídos de golpes de Estado” . Com efeito, os dois países ter-se-ão comprometido a realizar sufrágios eleitorais até 31 de Dezembro de 2013. Viu-se.

Por outro lado, haveria a necessidade do Governo de Transição ser reconhecido internacionalmente, para poder levar a cabo as tarefas a que se propôs, designadamente a condução do processo eleitoral, o que o autor admite como plausível. Mas, acrescento, com excepção da CEDEAO, mais ninguém o reconhece.

Menos claro foi o julgamento do capitão Pansau N’Tchama que acusou o deposto CEMGFA, Zamora Induta, de o ter coagido à tentativa de “putsch” de 21 de Outubro de 2012, acusando as autoridades gambianas de envolvimento na suposta operação, bem como inúmeras personalidades locais com ligações ao PAIGC e a figuras militares e politicas, algumas de destaque como é o caso de Domingos Simões Pereira, então Secretário Executivo da CPLP. O julgamento, aduzo, poderia, por assim dizer, “limpar o terreno” de muitos elementos incómodos e permitir uma actuação “mãos livres” de António Indjai (actual CEMGFA) e de Bubo Na Tchuto, entre outros. Até aqui nada de novo, a Guiné-Bissau conhece desde há muito estes processos sombrios como devem ser conduzidos e para que servem.

Alguns factos, porém, vêm a alterar o panorama. Em Abril de 2013, o almirante Bubo Na Tchuto é apanhado numa armadilha muito bem montada pela DEA (Drug Enforcement Agency) norte-americana, detido em águas internacionais e levado para os EUA, a aguardar julgamento. Estavam em causa 4 toneladas de cocaína (cujo valor médio na rua pode atingir entre 130 a 160 milhões de Euros!). Sabia-se que Na Tchuto, bem como Papá Camará (Chefe de Estado Maior da Força Aérea) e o próprio António Indjai, estão desde há muito envolvidos no tráfico de droga. O primeiro estava identificado pela DEA desde 2010. Tanto quanto sei por outras fontes, a operação consistiria na troca de armamento das Forças Armadas da Guiné-Bissau para a guerrilha colombiana das FARC por cocaína. Não se trataria de armamento convencional, mas, sim, de mísseis terra-ar! Os agentes da DEA fizeram-se passar por membros da guerrilha. Em suma, estamos a falar de uma operação sofisticada a uma escala muito grande e que teria outros envolvimentos cujos pormenores, porém, desconheço.

Por outro lado, soube-se que Na Tchuto permitiu a evasão de 3 jihadistas mauritanos acusados de terem assassinado 4 turistas franceses no sul da Mauritânia em 2007. Um agente secreto norte-americano teria sido despachado para o local mas apareceu morto (degolado), o que indicaria a presença de fundamentalistas islâmicos. Na opinião de Braga Pires, para além de traficante de droga, Bubo Na Tchuto teria ligações à AQMI (Al Qaeda no Magrebe Islâmico) que opera na África Ocidental, designadamente na Guiné-Bissau.

Para a detenção de Na Tchuto, os norte-americanos terão presumivelmente obtido a cumplicidade de Indjai, uma vez que este queria livrar-se de um rival e os norte-americanos a detenção do almirante. Este último era objecto de um processo de reabilitação por envolvimento num golpe de Estado (mais um no rol que averba a Guiné-Bissau) em 26 de Dezembro de 2011, que levou ao seu exílio temporário na Gâmbia. Ora, Na Tchuto tinha por objectivo principal substituir Indjai como CEMGFA. É tão simples quanto isto.

Como refere a justo título o autor e citamos: “A primeira novidade da acusação apresentada pelos americanos é absolutamente demolidora para as duas principais figuras do Período de Transição: o Presidente interino, Manuel Serifo Nhamadjo e o Primeiro-ministro interino, Rui Duarte Barros, são implicados nas provas apresentadas pela DEA.” Aparentemente, essas altas figuras do Estado beneficiariam de 13% do “produto/negócio” (?), apesar dos desmentidos indignados, a dúvida obviamente permanece.

Dizer que a credibilidade da Guiné-Bissau e das mais altas figuras civis e militares do Estado foi afectada é um mero eufemismo. Resta saber neste quadro pouco auspicioso como é que a Guiné-Bissau se vai financiar para poder realizar eleições? O próprio Secretário-geral da ONU já admitiu que pode deixar cair a Guiné-Bissau e abandoná-la como a Somália. Se a Guiné-Bissau não consegue assumir as funções basilares de um Estado será ou não um Estado falhado? Era bom que não se mastigassem as palavras.

Aliás, os acontecimentos mais recentes naquele país, caso dos 74 sírios embarcados à força nos aviões da TAP, que levaram à suspensão das ligações aéreas Lisboa-Bissau, reforçam a nossa tese, isto é que não se está perante um Estado minimamente sério.

No meio de tudo isto e tendo em conta o julgamento do capitão Pansau N’Tchama, as tensões étnicas, as fricções do foro castrense, as rivalidades entre diferentes pseudo-líderes civis e militares e, agora, os atritos inter-religiosos geram um quadro de forte instabilidade que pode desembocar numa guerra civil gravíssima. O alerta aqui fica.

Registo que Raúl Braga Pires chama a atenção para um facto novo: o conflito entre sunitas e xiitas. A maioria da população islamizada é como se sabe de obediência sunita, mas os libaneses, de fé xiita, há muito radicados no país, já criaram raízes e prosélitos na Guiné-Bissau. Iremos assistir à criação de mais um foco de tensão, até agora insuspeitado?

Haveria que reflectir-se sobre a intervenção francesa no Mali e no problema da droga. A questão é, para todos os efeitos, regional. De acordo com várias fontes fidedignas, o circuito da droga parece estar a alimentar os jihadistas e a Guiné-Bissau aparece nesta equação como um factor que, pelas razões expostas, não pode ser ignorado. A pacificação do Mali – e sabendo-se da proliferação dos grupos islamitas por todo os Estados do Sahel – é uma questão de importância vital, mas essa intervenção não pode limitar-se apenas ao Norte do Mali, como se tratando apenas de um abcesso localizado a extirpar, a Guiné-Bissau, cujos governantes actuais não merecem qualquer credibilidade, terá também de ser intervencionada, ou seja o alargamento da Missão de Paz no Mali pode (deve) estender-se à Guiné-Bissau.

Bom, já agora, eleições para quando?
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Embaixador Francisco Henriques da Silva

PAIGC: Congresso foi marcado na reunião do Comité Central: terá lugar em Cacheu, de 30 de janeiro a 3 de fevereiro. Octávio Lopes, mantém-se como líder da bancada parlamentar dos 'libertadores'. A ver se é desta... AAS

20 de Janeiro: Discurso do Comandante Pedro Pires


No Encalço de Amílcar Cabral

Sabemos também que, no plano político, por mais bela e atraente que seja a realidade dos outros, só poderemos transformar verdadeiramente a nossa realidade com base no seu conhecimento concreto e nos nossos esforços e sacrifícios próprios.

«A comemoração de uma data, tão carregada de significado histórico e político como o dia 20 de Janeiro, não é uma tarefa simples. A primeira advertência consiste em evitar os caminhos repisados e estafados e a repetição de lugares-comuns. Esta preocupação alerta para o facto de que é preciso precaver-se para que as repetidas celebrações não banalizem este marco histórico, reduzindo-o a um mero ritual, destituído de qualquer significado.

No meio disso, emerge uma dúvida que teima em me apoquentar. É esta: terá sentido a celebração da morte? Evidentemente, não é nosso propósito celebrar a morte resultante de um ato vil de traição, ao serviço do inimigo colonial. Igualmente, não desejamos celebrar a enorme tragédia que foi o assassinato do líder do PAIGC. Estamos a celebrar, sim, a dimensão histórica do homem que, mesmo quarenta e um anos após o seu desaparecimento, nos vem impressionando pela sua clarividência, lucidez e exemplo, cujo legado político, moral e cultural devemos salvaguardar e nele buscar inspiração para a construção de soluções para os grandes desafios com que nos confrontamos, com que a África se confronta e, ousaria mesmo dizer, com que a humanidade se confronta.

A morte é o fim da vida terrena. Sobre isto creio que não há dúvidas. Entretanto, sem depreciar as amarguras da morte, os sofrimentos e as tragédias humanas, impõe-se-nos extrair, destes, lições positivas e negativas, como costumava dizer Amílcar Cabral, em defesa e prosseguimento do combate emancipador que, ainda hoje, compete-nos levar avante em prol da liberdade, da dignidade, da equidade, do bem-estar e do progresso do nosso país.

A “ética cabralista” reclama de todos nós sinceridade, lealdade, comprometimento, generosidade e otimismo. Aliás, o nosso compromisso com Amílcar Cabral deve, sobretudo, ser de índole moral. Retomo uma conclusão sua, a propósito do exercício da liderança política, em que afirmara: “No âmbito geral do movimento de libertação, especialmente nas condições como as nossas, o comportamento moral do combatente, em particular dos dirigentes, é um fator primordial que pode influenciar significativamente o êxito ou o fracasso do movimento.” E sublinhou, a seguir: “Em qualquer outro empreendimento humano, o homem (a sua mentalidade e o seu comportamento) é o elemento essencial e determinante.”

Em relação à dimensão humana dos seus “companheiros de luta”, não se inibia em apontar os seus erros e limitações, de que se pode apreender uma postura fundada no realismo, na verdade e na sinceridade. A forma como encarava os erros era essencialmente pedagógica: dos erros devem ser tiradas lições; da correção dos erros, melhorar as nossas capacidades; com as lições extraídas fortalecemos a nossa personalidade e ganhamos em autoconfiança. Com efeito, dos erros, descobrimos os caminhos mais acertados para prosseguir a defesa e a promoção da causa que abraçamos. Em síntese, a análise crítica é uma componente imprescindível do exercício da liderança.

Por esta e outras razões, não se deve exagerar no temor pelos erros, nem escamoteá-los, pois, o seu reconhecimento e assunção representam uma predisposição de coerência e de honestidade intelectual e um ponto de partida primário para a aprendizagem, na medida em que a aquisição do conhecimento começa precisamente “quando, humildemente, reconhecemos e assumimos o que não sabemos”, a nossa ignorância. Para cimentar esta ideia recorro ao pensamento do ilustre pedagogo da “educação como prática da liberdade”, o professor brasileiro Paulo Freire.

Na perspetiva de Paulo Freire, “Não existe o ‘ser’, mas sim o ‘está sendo’”. Segundo ele, “todos somos incompletos, já que precisamos uns dos outros; inconclusos, já que estamos em transformação; e inacabados, ou seja, imperfeitos.” Assim sendo, impõe-se-nos reconhecer a necessidade do nosso progressivo aperfeiçoamento moral e intelectual, apropriando-se da condição de “homens aprendentes”. Está subjacente a ideia do “aprender sempre”.

Em síntese, é no homem, na pessoa, que é preciso centrar toda atenção. É este homem cabo-verdiano, é este homem africano, que é preciso conhecer, apreender a sua dimensão humana, enfim, descobrir as suas aptidões e fraquezas. Para liderar eficazmente e estabelecer estratégias eficientes é essencial conhecer melhor a dimensão dos homens e das mulheres com que lidamos, até, para descobrirmos em quê é que é preciso mudar ou aperfeiçoar.

Com efeito, para avançar com maior segurança e ultrapassar os obstáculos e bloqueios da caminhada, o conhecimento mais aprofundado da sociedade, em que se intervém, da sua idiossincrasia, é essencial para o exercício de uma liderança eficaz e o estabelecimento de objetivos e metas exequíveis na realização das aspirações ao progresso, à prosperidade e ao bem-estar.

No nosso caso, seria pertinente descobrir os fantasmas, os dilemas e os medos que povoam os nossos espíritos; as fraquezas, alienações e defeitos que condicionam ou obstaculizam a nossa marcha. Naturalmente, teríamos que, antes de tudo, valorizar e potenciar os nossos importantes recursos morais e intelectuais, que são afinal o suporte para enfrentar com sucesso as batalhas, que somos chamados a levar avante.

Numa perspectiva de convergência de propósitos, podíamos interrogar-nos sobre as consequências decorrentes dos atrasos e bloqueios provocados por hesitação e por receio em correr riscos. À atitude de hesitação contraponho o espírito de Cabral. Basta reparar no destemor e na ousadia com que afirmou, audazmente, perante a prestigiada audiência da III Conferência dos Povos Africanos (Cairo, 1961), que a “crise africana longe de ser uma crise de crescimento é uma crise de conhecimento”. Significou um repto arriscado lançado a líderes, analistas e decisores africanos, da época. Das minhas andanças e relações em vários países africanos, fiquei convencido de que esta asserção continua de enorme atualidade.

Na mesma ocasião, fustigou a falta de iniciativa, a hesitação e a improvisação da solidariedade africana com as lutas de libertação nacional, para rematar depois que várias das experiências se mostravam, tanto carentes de um projeto político sólido, como desgarradas da realidade concreta. Aliás, tratava-se de dois princípios que lhe eram muito caros: a fundamentação do projeto de libertação nacional e o realismo político na sua execução.

Ainda, nesta linha de pensamento, destacaria outro ensinamento e advertência que constituem legado seu: podemos e devemos aprender com a experiência dos outros, mas não devemos, ingénua e acriticamente, copiá-los. O mesmo espírito crítico deve acompanhar-nos em toda ação política que realizamos ou conduzimos. Podemos e devemos aprender com Cabral. Porém, não devemos cair na insensatez de querer copiá-lo ou imitá-lo. Poderemos, porventura, “recriar” o seu pensamento, para os tempos presentes.

Vejamos algumas das utopias que, espiritualmente, o inspiraram e também me têm alentado e inspirado a sonhar e a agir. Para Amílcar Cabral, o homem colonizado e oprimido liberta-se sobretudo pela ação, individual e coletiva, e realiza-se através da luta de libertação nacional. Constrói, por este meio, a sua humanidade, a sua condição de pessoa livre e, enfim, a sua condição de fazedor de história, mas, onde não existe separação entre a liberdade e a responsabilidade, pois, uma coisa transporta consigo a outra. Em suma, a libertação tem que ser uma obra coletiva, fecundada no seio comunidade nacional e por ela construída.Esta mesma tese pode ser transposta, à letra, para o cenário atual do desenvolvimento institucional, económico, social e cultural, em curso no nosso país.

A materialização do ideal da libertação deve ser entendida como um processo complexo e de longa duração, envolvendo diversas variáveis, nos campos da política, da economia, das finanças, do conhecimento, da tecnologia, da gestão e do conhecimento, no geral, e é sempre obra de várias gerações. Em síntese, deve ser um projeto nacional, fecundado e assumido pela comunidade nacional. Pressupõe a criação de mais riquezas, a acumulação de meios materiais para a sua sustentação e a capacitação de recursos humanos para a equacionar e assegurar a sua realização.
Difere de qualquer projeto para a sobrevivência. É uma opção política para a construção de uma visão que permitirá, a prazo, a autonomia política, económica, cultural e social ou seja o desenvolvimento integral e sustentável. E o seu primeiro corolário, porque fruto da experiência histórica da colonização e da sua antítese, é concisamente: não se pode entregar o nosso destino em mãos de terceiros. Enquanto uma interpelação permanente, fica o dever patriótico de assegurar a independência e o futuro progressista da Nação.

Mudando de espaço temporal para o presente, a minha percepção é que a nossa sociedade, enfim, o nosso país atravessa uma conjuntura de ansiedade e de relativo desassossego. Trata-se, com efeito, de uma questão do Pão e da sua distribuição. E a pergunta decorrente é: como poderemos multiplicar os nossos pães? Certamente, será através da descoberta de recursos potenciais que podem ainda estar encobertos e não são aproveitados; na correção dos nossos erros e omissões; na superação das nossas insuficiências; na confiança e valorização das capacidades nacionais de inovação e de criatividade.

Entre as muitas insuficiências nossas, encontra-se o conhecimento deficiente da nossa própria terra, da nossa própria realidade. O seu primeiro corolário é a necessidade de um esforço geral das lideranças e dos atores políticos e sociais para sua redescoberta desejada e consciente. Outrossim, para a superação das desvantagens da fragmentação e da dispersão territorial, somos convocados a resistir às tentações “insularistas” e a abraçar o país, por inteiro. Na verdade, é preciso abraçar Cabo Verde, por inteiro!
Ao analisar a comunicação entre os atores políticos e sociais nacionais, apercebe-se de que os diálogos têm sido abundantes. Pelos vistos, têm-se revelado insuficientes ou ineficientes, creio porque lhes têm faltado uma boa dose de sinceridade. Este facto, por si só, apela o retorno aos valores elementares da sinceridade, da lealdade e da responsabilidade partilhada.

Numa outra perspectiva, não é benéfico nem eficiente entender que reside no Outro a fonte dos nossos embaraços. É preferível descobrir as causas verdadeiras dos bloqueios, atrasos e dificuldades, porquanto, os sucessos e os reveses são sempre compartilhados e têm repercussões, boas ou más, em todo o corpo territorial. Deste modo, a responsabilidade pelo presente e pelo futuro da nossa terra exige ser olhada numa perspectiva coletiva e cooperativa. Neste sentido, a facilitação dos nossos êxitos requer a assunção e a prática de boas regras na convivência nacional: a cooperação entre os atores institucionais e sociais; a convergência de esforços; a complementaridade dos projetos e dos interesses; a subsidiariedade entre os espaços territoriais; e, finalmente, a solidariedade nacional. Como uma nota subsidiária, interrogo-me até que ponto não se devia dar mais atenção à prática do planeamento estratégico em que haveria um quadro integrador do desenvolvimento, assumido nacionalmente, e que permitiria concomitantemente vencer os inconvenientes da navegação à vista.

É, ainda, crucial a redescoberta das boas práticas na gestão e no exercício da direção, em que desatacaria: a eficiência e a poupança no uso dos meios disponíveis; a boa escolha das prioridades; o espírito de criatividade e de inovação e, por fim, a aposta no reforço da capacitação dos recursos humanos. Ademais, somos convocados a libertar-nos do pressuposto de que as coisas são resolvidas sempre pela via da cooperação internacional. Em contrapartida, compete-nos procurar e encontrar alternativas endógenas, através do melhor aproveitamento dos recursos internos, da criação de mais riquezas, da poupança dos recursos e da eficácia no seu uso. Neste caso, vale a pena buscar inspiração na nossa história, recente e longínqua: somos um povo de resistentes e de heróis anónimos. É deste modo que temos sobrevivido e vencido.

Outro princípio salutar é estar atento e refletir sobre o que tem sido o percurso do Cabo Verde: onde estamos e como estamos? Não resta dúvida de que o país fez um percurso notável, que deve continuar a inspirar-nos confiança. Porém, as fragilidades económicas e a limitação de recursos internos, ainda prevalecentes, recomendam-nos uma atitude de prudência e de precaução e a fazer uma gestão muito rigorosa da coisa pública. É manifesto que o nosso campo de absorção de derrapagens e de crises é extremamente limitado, ou seja, as nossas margens de manobra são muito estreitas. São estes parâmetros que devem balizar a nossa atuação e o nosso pensamento. Nestes termos, as nossas expectativas individuais e coletivas não devem exceder àquilo que as riquezas criadas e os meios financeiros libertados pela economia nacional nos possam facultar.

Outrossim, a economia cabo-verdiana está inserida numa economia mundial globalizante, da qual sofremos os efeitos, quer das suas vantagens, quer das suas desvantagens. Hoje, são os efeitos penalizantes da conjuntura atual de crise, particularmente na EU, que representam o lado penalizador das desvantagens, enquanto, os recursos provindos da cooperação e do comércio e do turismo representam a componente vantagens. Compete-nos consolidar os fatores favoráveis e atenuar ou eliminar as desfavoráveis. É neste quadro que ganham importância a qualidade e a pertinência das políticas públicas e das actividades privadas no sentido da criação de mais riquezas e do aproveitamento das vantagens competitivas.

Num outro campo de atuação, é hoje opinião fundamentada, entre os estudiosos, de que da representatividade, da qualidade e da eficácia, noutras palavras, das capacidades reais das instituições estatais dependem, em grande medida, o sucesso dos projetos políticos propostos e assumidos pelos agentes políticos ao serviço das respetivas Nações, bem como, a garantia da segurança, da estabilidade, do bem-estar e do progresso. Com efeito, a solidez e a eficácia das instituições constituem os esteios que sustentam o sucesso de qualquer projeto em construção.

No caso cabo-verdiano, sou da opinião de que as nossas instituições estatais reúnem os requisitos essenciais para sustentar, com sucesso, a continuação da edificação do nosso projeto comum ou dos nossos projetos de sociedade. Porém, há indícios da necessidade de melhorias e de aperfeiçoamentos, quer das estruturas orgânicas, quer na qualidade dos agentes e das lideranças. É obra para os agentes políticos ganhar a consciência dessa necessidade e propor programas de reformas consequentes e pertinentes que contribuam para a eliminação de falhas funcionais, de multiplicações e de sobreposições de funções e que proporcionem ganhos em produção e em poupança de recursos.

Em jeito de conclusão, estimo que se impõe repensar a forma como fazemos ou temos feito a política: avaliar as nossas práticas e fazer uma apreciação crítica lúcida das nossas experiências. E, a partir daí, tirar lições e reelaborar atitudes, práticas e metodologias na perspetiva da ética política cabralista.

Na minha visão, a sociedade cabo-verdiana está perante um dilema cuja superação vai exigir dela o rompimento com determinados hábitos e práticas. Haverá-que escolher entre manter a rotina, a indiferença e o tudo-na-mesma, por um lado, ou a interiorização e a apropriação de novos preceitos e práticas responsabilizadoras, por outro. Entendo que seria indispensável o rompimento com as propensões à alimentação de relações de dependência clientelar e o apoderamento de práxis emancipadoras que associassem a democracia à maior democratização social; a mais participação cívica e a maior responsabilização individual e coletiva.

DEMOCRACIA PARTICIPATIVA, PARTICIPAÇÃO CÍVICA E RESPONSABILIDADE PARTILHADA seriam eixos primários do funcionamento desse Estado de Direito (cabo-verdiano), forte e capaz.

Por outras palavras, os espaços públicos não devem ser apenas espaços para afirmação de necessidades e de direitos. Para o nosso bem, têm que ser igualmente espaços de afirmação de deveres e de responsabilidades.

Senhor Presidente da Câmara Municipal,
Minhas Senhoras e meus Senhores,
Estimadas amigas e caros Amigos,

São algumas reflexões que me pareceram pertinentes para o momento, procurando afastar os riscos de banalização a que me referi no início.

Muito obrigado!

Mindelo, 20 de Janeiro de 2014