FRANCO NULLI deixou Bissau hoje, dando assim, por finda a sua missão como Delegado da União Europeia na Guiné-Bissau. Não a ligação ao País, de que diz "gostar muito". E eu sei que é a verdade.
Franco Nulli, acompanhado da sua mulher, viajou para Dakar. A viagem continua rumo a Joanesburgo (África do Sul) onde terá de aguardar uma horinha pelo vôo que o levará para a Zâmbia, terra da sua mulher, para viver a sua merecida reforma. O embaixador, para alêm da sua casa, está a contruir uns bungalows, uma espécie de turismo rural para receber turistas e amigos.
Conheci Franco Nulli ainda no tempo do Kora Club, nos anos oitenta. Trabalhava como fiscal para uma empresa italiana. Não tivémos nenhuma relação especial mas posso dizer que já bebemos da mesma garrafa de um bom scotch.
Franco Nulli convidou-me uma vez para uma festa muito bonita (com passagem de moda e tudo) nos jardins da representação que dirigia. Partilhámos um caldo de chabéu, num almoço apressado de trabalho em casa de interposta pessoa.
Tivémos também dois ou três encontros de trabalho no seu gabinete, para um trabalho que eu estava a realizar para a União Europeia. Tirando isso, um ou outro encontro casual, de circunstância, com cumprimentos breves mas afáveis - reconheço. De resto, outra coisa não seria de esperar do Embaixador Franco Nulli.
Ultimamente - e muito por causa do 'incidente' do 1 de abril - as nossas relações, que eram praticamente nenhumas, simplesmente esfumaram-se. Foi até no café Dias&Dias (que é de onde escrevo este post, entre dois cafés e muitos, mas muitos cigarros) que se deu o que se segue.
Quando entrei, vi-o sentado com amigos e assim que nos encaramos, começou a abanar a cabeça de um lado para o outro e a gesticular. Depois, disse: "Assim não, Ticha. Assim não". Apertei-lhe a mão e segui o meu caminho, por entre um sorriso maroto. Mas não era nada de pessoal contra Franco Nulli, e sim contra a instituição que representava.
Eu percebi a mensagem, mas, menos de 36h depois, o blog lançava outra notícia-bomba: a recação de Nulli, depois da declaração do Presidente da República, Malam Bacai Sanha. Obviamente, Franco Nulli não gostou. E, não gostando, reagiu diplomaticamente deixando simplesmente de me cumprimentar.
Estranhei e perguntei a amigos comuns. Que sim. Nulli não aprovava de maneira nenhuma os constantes 'ataques' do blog ditadura do consenso à União Europeia, de que era Delegado, o rosto da Europa dos 27 na Guiné-Bissau.
Para a história da sua passagem pela Guiné-Bissau, ficam as duas pontes - a de João Landim e a de São Vicente, duas das maiores obras de engenharia (e de vulto) que o País conheceu. Estamos reconhecidos.
A Guiné-Bissau ficou ainda a ganhar, com várias leis e reformas, algumas prontas, outras em preparação, outras já em execução, e ainda projectos vários financiados pela União Europeia.
O Presidente da República, Malam Bacai Sanha, condecorou o Embaixador, agradeceu-o e reconheceu os esforços e o empenho de Franco Nulli durante os seus anos de missão na Pátria de Amílcar Cabral. Uma missão nada fácil, a do embaixador: cheia de espinhos e de barreiras; enfim, Franco Nulli teve de ajudar a apagar muitos fogos. Nuns, ficou chamuscado; noutros saiu quase assado...
Pela parte que me toca, foi um prazer ter conhecido Franco Nulli. Como pessoa e como embaixador e representante maior da União Europeia no meu País - a Guiné Bissau. Imagino que Franco Nulli, neste momento a voar para a África do Sul, esteja a sentir saudades da Guiné-Bissau; imagino Franco Nulli a olhar para a mulher e a assentar-lhe um beijo suave e terno no rosto; imagino Franco Nulli a olhar pela janelinha do avião e a não reconhecer nada do que vê lá em baixo. Os tons de verde não são mais os mesmos. É a saudade, palavra não traduzível em italiano, nem, diz-se, em mais língua nenhuma.
Eu, tenho já saudades do Franco Nulli. E o meu desejo é o de que, um dia, Franco Nulli e a sua mulher possam regressar à Guiné-Bissau para nos visitar, e encontrar um País estável, reconciliado e desenvolvido. Um País orgulhoso do seu conturbado passado. Que venha um encontrar um Povo que soube perdoar.
Que venha encontrar uma Guiné-Bissau que a Europa, bem ou mal, ajudou e ajudará a reerguer-se para, como dizia Amílcar Cabral, "caminhar pelos seus próprios pés e ser guiado pela sua própria cabeça".
Abraço fraterno,
António Aly Silva