quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Uma mão cheia de nada


Desaparecer do nada e aparecer em coisa nenhuma. Algumas pessoas ficam espantadas quando nos cruzamos: "Regressaste?", "Pensava que já não voltarias", coisas do género, antes de um abraço caloroso. Outras apagaram simplesmente o meu número de telefone das suas listas de contacto. Exilou-se, terão pensado. Mas a verdade é que estou aqui. Não, não sou uma aparição. Regressei apenas ao meu país, quando muitos daqueles que aqui estão...apenas fazem por nos estragar o dia, nos empatar a vida...

Outra verdade é que sinto que vivo num país ocupado militarmente, cheio de tensão nos rostos das pessoas, inundado de boatos sussurrados (alguns bastante engraçados até) de notícias baralhadas, algumas sem pés nem cabeça. Não menos verdade: estou num país encharcado, e cruzo extensas zonas do centro da cidade completamente alagadas (isto repete-se ano após ano mas parece que a engenharia nem existe). Assim, vivo num quase-pântano.

Ontem, recebi uma chamada que era, para além de uma denúncia, um acto de desespero, de impotência. Consegui confirmar a veracidade da história que se segue: Uma menor tinha sido violada, houve queixa (incluindo junto do instituto da mulher e da criança) mas um telefonema fez parar tudo. Tão grave quanto a violação: à televisão da Guiné-Bissau, que foi fazer a reportagem, foi-lhe terminantemente proibida de passar a peça.

Estaremos a viver, hoje, numa espécie de ditadura encapotada? Por que carga de água é que as manifestações continuam, quase cinco meses depois do golpe de Estado de 12 de abril, proibidas? Um direito (con)sagrado preto no branco na nossa Constituição!? Meus caros, lembro-me perfeitamente das manifestações depois dos assassinatos ocorridos em 2009. Manifestações dia sim, dia sim a pedir Justiça. Manifestações em que eu, ciente da minha responsabilidade enquanto cidadão, partcipei. Nunca acusando ninguém, mas pedindo responsabilidades políticas. Pedindo Justiça.

Muito a propósito: quem me fará Justiça? Quem deu mesmo ordens para a minha prisão e espancamento? E já agora que perguntar não ofende, porquê mesmo? Nunca escrevi sobre a minha passagem pelo Estado-Maior no passado dia 13 de abril, onde NÃO fui acusado de nada. Nem de perturbador, nem de conspirador, nem de nada. "Insultaste-nos" - foi o que me disseram. E apenas porque algumas pessoas perfeitamente identificáveis telefonavam a acusar este ou aquele... Mas assim que cheguei ao comando, talvez uns dez minutos, veio logo alguém a correr para dizer "kuma és pudi bai". 'És' era eu, bem entendido. Mas não fui. E não fui porque alguém disse "ponham-no na cela até eu regressar", e regressaria apenas às 19 horas.

Mas depois é que foi o bonito. "Bu kara ka estranho". E antes que eu conseguisse inspirar o ar abafado da sala pequena, alguém chegou-se à frente: "I fidju di 'Beto', anta bu ka na odja ki rosto ku kurpussinho?" - (o meu falecido pai integrou o ministério da Defesa desde o seu começo até vir a morrer em 2003). "Fidju di 'Beto'? Ala ki rostu gora dê!... Nããã, bai, bai bu kaminho". Assim. Preso, espancado, quase decapitado e o troco é a humilhação.

Somos todos filhos deste país, corre nas nossas veias o mesmo sangue. Se alguém morre sentimos e partilhamos da mesma dor. Somos um cruzamento de todas as etnias que compõem esta bela terra. Somos guineenses, somos um povo uno. Não nos dividam, não tentem sequer dividir-nos. Deixem que continuemos a cumprimentar-nos, ainda nem nos conheçamos. Deixem-nos exorcizar os nossos fantasmas e expelir o que nos vai na alma. AAS

MAIS TROPAS: Uma novo contingente de soldados nigerianos com destino à Guiné-Bissau, apressam o seu treino em Jaji, região central do Estado de Kaduna, de acordo com fontes da Defesa da Nigéria. AAS

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

PAIGC reúne, amanhã, com a CEDEAO para falar sobre a saída para a crise. E terá um encontro com os parlamentares da UEMOA. AAS

Últimas


- PAIGC iniciou agora reunião com partidos que condenam e contestam o golpe de Estado: UM, MDG, PST, UPG, entre outros. Em preparação, está um memorando sobre a 'situação actual do país' que será enviado ao presidente de transição, Serifo Nhamadjo;

- Alamara Nhassé, presidente do PRM, acaba de enviar uma carta a Manuel Saturnino da Costa pedindo a sua reintegração no PAIGC. O acto oficial terá lugar no próximo dia 19 de setembro, data da fundação do partido. AAS

Terra molhada


Para os desatentos: já regressei a Bissau. E a primeira coisa que me vem à cabeça é: molhado. Desde segunda feira que tem chovido. E está húmido - arrisco mesmo uns 90. Em contrapartida está verde. Contudo, a água que cai não chegará para inundar os boatos que correm lesto por esta cidade fatigada.

Desde que cheguei que não saio do perímetro da cidade. Estou sem carro. Melhor: vendi-o há coisa de um mês. Tinha de ser. A primeira coisa que vi na segunda-feira assim que saí do café foi uma carrinha grande cheia de militares da CEDEAO. Acompanhei-os com o olhar até desaparecerem. Hoje vi mais duas carrinhas, cheias de militares com capacetes vistosos. Tnham as luzes azuis ligadas, e cintilavam. Desceram a avenida Domingos Ramos e contornaram a rotunda da praça Che Guevara. Mas na terça-feira saiu-me a sorte grande: vi três oficiais da CEDEAO a emborcar cerveja num bar. Bom, mas como estava calor...

A verdade é que a vida da população deteriorou-se. Ontem, por exemplo, no mercado de Bandim, as mulheres que vendem diariamente nesse mesmo mercado estavam histéricas. Disseram que enquanto aguardavam para pagar a 'feira', funcionários da Câmara de Bissau apareceram de repente e levaram-lhes as coisas...gritavam, gesticulavam e rogavam pragas. E davam excelentes palmadas nas coxas fartas. Resultado: regressaram às suas casas de bolsos vazios.

A cidade tem tido energia eléctrica regularmente, com algumas falhas, mas as luzes da avenida dos Combatentes da Liberdade da Pátria há muito que deixaram de iluminar a via de 7 km... Na madrugada em que cheguei estava completamente escura e os semáforos estavam desligados. Agora, imaginem o que é estar neste bréu, e ainda por cima com chuva. Simplesmente assustador, digo-vos.

A noite de Bissau está, desde que aqui cheguei, praticamente morta. Ressuscitará, ao que parece, hoje. Os restaurantes contam os clientes pelos dedos de uma só mão (ao almoço é diferente). A vida está mais cara, é o que tenho ouvido. Mais cara e, acrescento, incerta. Nos hotéis, é a penúria: não há clientes e quase todos eles tiveram que despedir funcionários. Os cafés têm menos gente do que o habitual.

Politicamente falando, a cidade está agitada (mas alguma vez deixou de estar?!). O PAIGC, na iminência de ser chamado a formar/integrar(?) o governo, multiplica-se em reuniões, com a FRENAGOLPE e com os partidos políticos que contestam o golpe de Estado de 12 de abril. A sede dos 'libertadores' é o ground zero por estes dias. Veremos o que dali sai. AAS (continua)
Nota-se alguma tensão.

Adultério acaba em assassinato


Domingos da Silva, eleito deputado pelo PRS na legislatura anterior, foi assassinado à facada, em Bafata, região leste da Guiné-Bissau. Actualmente professor nesta cidade, Domingos da Silva não resistiu aos ferimentos causados por uma arma branca. O assassino, de nome Fernando Npaka, acusara a vítima de manter uma relação íntima com a sua esposa. AAS

Novo governo e alargamento à CPLP de força de estabilização


A crise política criada pelo golpe de Estado de abril na Guiné-Bissau, evolui no sentido da transferência para a ONU e/ou para a UA da coordenação do processo de transição política. Outras tendências são a entrada da CPLP na força de estabilização, e a constituição de um novo governo alargado ao PAIGC, com a missão apurar a governação e preparar a realização de eleições gerais.

Os países da CPLP dos quais serão originiárias os contingentes a agregar à força de estabilização, variarão consoante a natureza que a mesma vier a ter. É notada uma vontade particular de Angola de participar, quer a força seja continental ou internacional. Em caso de força internacional ou mista, o Brasil também é candidato.

A ONU e a UA dispõem já de garantias suficientes de que estão criadas condições políticas e práticas para a introdução de mudanças no quadro da actual situação na Guiné-Bissau – consideradas de importância capital, tendo em vista o fim do isolamento externo do país e abrandamento/levantamento de sanções internacionais.

Para 13 e 14 de Setembro, em Nova Iorque, está marcada uma reunião alargada a todas as partes interessadas no processo – ONU, UA, União Europeia, CEDEAO e CPLP. O objectivo é o de definir um modelo de coordenação do acompanhamento do processo e adoptar o respectivo roteiro.

Entre as ideias chave em que se inspirará o roteiro para a paz e estabilização da Guiné-Bissau avultam a reestruturação das Forças Armadas e de segurança e melhorias no funcionamento do sistema judiciário. É admitida a possibilidade de integrar temporariamente no corpo de juízes magistrados contratados em Portugal ou Brasil.

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Brasil quer diálogo entre a CEDEAO e a CPLP



O ministro brasileiro das Relações Exteriores, António Patriota, esteve em Cabo Verde por poucas horas, para um meeting com Jorge Borges, seu homólogo caboverdeano, sobre a cooperação entre os dois países. Falaram também sobre as grandes questões regionais e internacionais da actualidade. Motivo: a próxima Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU), a ter lugar este mês, em Nova York, onde o Brasil, a 6ª maior economia do mundo, quer marcar pontos.

Mas... Patriota tinha acabado de deixar Dakar...no Senegal, onde manteve encontros com os governantes deste país vizinho da... Guiné-Bissau. E é assim, amiúde, que chegaram à situação da Guiné-Bissau. Patriota abriu finalmente o jogo, revelando que ele próprio "tem estado a conversar com os seus homólogos de vários países" no sentido de, juntos, "encontrarem estratégias capazes de produzir resultados concretos em termos de estabilização e que possam garantir a democracia e as condições de desenvolvimento na Guiné-Bissau.

O ministro brasileiro deu mais um passo, sugerindo mesmo a realização de "um diálogo construtivo e uma coordenação", que espera ser "a mais eficaz possível entre a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) e a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP)". AAS

Assinaturas por Cadogo: FRENAGOLPE está a recolher assinaturas para exigir o regresso ao país do primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior, deposto a 12 de abril por um golpe de Estado. AAS

António Aly Silva, acabado de chegar a Bissau. Abraço todos. AAS

sábado, 1 de setembro de 2012

MPLA soma e segue



O MPLA, partido no poder em Angola desde a independência em 1975, lidera a contagem dos votos das eleições gerais em todas as 18 províncias do país, anunciou hoje em Luanda a Comissão Nacional Eleitoral (CNE).

A divulgação dos primeiros resultados provisórios atribui 2.519.403  votos (74,46 por cento) ao Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), seguindo-se em segundo lugar a UNITA, com 607.063 (17,94 por cento) e em terceiro a Coligação Ampla de Salvação de Angola (CASA-CE), com 153.427 (4,53 por cento). Os resultados correspondem a 57,49 dos votos contados, anunciados pela porta-voz da CNE, Júlia Ferreira. O anúncio dos próximos resultados provisórios será feito ao início da noite. LUSA

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

A transição estará em...transe?


Nunca é demais lembrar que, em termos gerais, a transição não é nada mais que o processo da passagem de um estado ou forma, para outro estado ou forma. Ora, na Guiné-Bissau, foi forjado um Presidente e um governo, ditos de transição, como forma de saída do impasse legal e politico criado pelo golpe de estado de 12 de Abril de 2012. Este governo e este Presidente deviam servir apenas para conduzir um processo de transição num determinado período de tempo limitado, que permitisse que o poder pudesse ser novamente devolvido ao povo, através do sufrágio popular...

Embora sabemos que não passam de “filhos adotivos dos golpistas, era de esperar que conseguissem manter a máscara de gestores do período de transição, até a conclusão desse processo.

Mas, o que temos assistido, é a máscara da transição a cair gradualmente, enquanto o Presidente e o governo ditos de transição mergulham numa tal transe, que os faz transitarem cada vez mais em direcção aos objectivos dos golpistas, despindo dessa forma a camuflagem de transicionistas. O nosso saudoso José Carlos Schwartz já dizia que “pó, tudo tarda ki tarda na mar, i ka ta bida lagarto”.

Os “transicionistas em transe”, no alto das suas ignorâncias, arrogâncias, prepotências e amadorismos, sem nunca terem sido mandatados pelo povo, resolveram introduzir, a socapa, alterações no judicial do país, colocando dessa forma os objetivos golpistas a frente do respeito a órgãos com alguma independência, que devia funcionar a margem dos interesses políticos ou partidários.

Acho que não é novidade para nenhum guineense que a mudança do Procurador-Geral da República faz parte apenas de uma estratégia que visa o assassinato político de Cadogo Júnior, antes de serem efetivamente forçados a realizar as eleições. Têm consciência que o povo guineense está farto dos golpes de estado que têm servido apenas para a resolução dos problemas dos golpistas e não do povo, por isso, este último golpe de estado de 12 de Abril, também acabou por funcionar com um balão de oxigénio na intenção de votos a favor de Cadogo Júnior.

Tendo consciência disso e sem muitos meios para iludirem o povo, os “transicionistas em transe” resolveram centrar esforços na liquidação política, pela via judicial, daquele que constitui maior ameaça numas eleições que serão forçados brevemente a realizar.  

No alto da sua ignoarrogância, o “Presidente transicionista em transe” veio dizer que quer que a Procuradoria-Geral traga todos, sem exceção, à justiça, desde que tenham de prestar contas à justiça. Julgo que qualquer guineense imparcial consegue fazer apenas uma interpretação dessa declaração: “traga-me o Cadogo Júnior à justiça”. Mas, lendo a letra a declaração de Serifo Nhamadjo, gostaria de lhe relançar umas perguntas:

1.       O “Presidente transicionista em transe” quer que a Procuradoria comece a trabalhar de frente para trás, ou de trás para frente? Explico: A procuradoria deve começar a trabalhar nos crimes cometidos desde 1974, até 12 de Abril de 2012, ou deve começar a trabalhar de 12 de Abril de 2012 a 1974?

2.       O “Presidente transicionista em transe” esquece-se que o cargo que hoje ocupa, nasceu de uma sequência de atos criminosos? O “Presidente transicionista em transe” esqueceu-se que a alteração da ordem constitucional é um crime público? Esqueceu-se que a violação de residências privadas e usurpação dos bens alheios também são atos punidos pela justiça? Esqueceu-se que a usurpação da liberdade, espancamento e violação de civis também constituem crimes públicos?

3.       Que morais têm um Presidente e um governo nascidos de progenitores criminosos para virem apelar que seja feita a justiça sobre outros atos criminosos decorridos no país?

4.       Que providências tomaram até hoje esses “filhos adotivos de criminosos”, para chamarem a responsabilidade, todos aqueles que intentaram contra os direitos individuais e a integridade física de um Jornalista e de uma cantora?

5.       Que providências tomaram para apurar responsabilidades sobre o assalto e roubo de três cofres com os respetivos conteúdos, na empresa Petromar?

É bom que o povo se mantenha atento, para não deixarem ser envolvidos nessa transe em que se encontram os transicionistas. Um dia vão voltar a poder depositar, nas urnas, o vosso veredito e aí, convém não terem memória curta para conseguirem julgar com isenção.  

Ainda bem que os familiares de Roberto Cachéu já começaram a perceber que poderão estar apenas a serem usados, como armas de arremesso, contra Cadogo Júnior. Por respeito ao desaparecido, nunca devem permitir nem tão pouco pactuar com isso…

Jorge Herbert

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

O Provocador Geral da República


"Caro Aly, agradecia o favor de publicar esta minha mensagem que vou dar como sendo um filho com boas intenções para este país.
 
O Provocador (Procurador) Geral da República.
 
Se não é de duvidar os verdadeiros motivos e as finalidade do Golpe de Estado de 12 de Abril, muito menos é de estranhar a recente nomeação como Provocador Geral da República de um senhor que sempre perseguiu politica e judicialmente Carlos Gomes Júnior.
O actual Provocador Geral da República sempre esteve na linha de frente daqueles que lutam a todo o custo para matar politicamente Carlos Gomes Júnior. Se é assim, como é possível confiar no trabalho desse homem? A encomenda já está feita, resta o homem fazer o seu trabalho que não é nem mais nem menos de que tentar a todo o custo incriminar Carlos Gomes Júnior. 
 
Se dois procuradores que antecederam o actual Provocador Geral não conseguiram provas que incriminam Carlos Gomes Júnior, não é porque não querem, mas sim porque foram lá com a intenção de fazer a justiça e não de fazer injustiça.

Quero fazer um apelo ao profissionais do Ministério Público para que sejam coerentes com a profissão que escolheram e não se deixam arrastar por pretensões politicas. Que não deixem levar por pessoais que vão lá não como juristas, mas sim como politicos. Pessoais que politicamente nada conseguem fazer e que querem aproveitar a capa de Provocador Geral da República para tirarem dividendos políticos.
 
Apelo a Comunidade Internacional, principalmente a ONU, UE, CPLP e alguns países da CEDEAO: Gambia, Togo, Guiné-Conakry, Cabo-Verde (ANTI_GOLPISTAS) para estarem atentos a esta investida do actual poder na Guiné-Bissau e de alguns países da CEDEAO.

Ao PAIGC, também uma palavra de alerta. É urgente reagirem e não deixem que os esforços feitos pelo Sr. Carlos Gomes Júnior e seu Governo sejam deitados a água abaixo. O alvo não é apenas Carlos Gomes Júnior, mas também o próprio PAIGC. O povo está convosco, portanto, não tenham medo. Reagem e denunciem isto a Comunidade Internacional.
 
Bolingo Cá"

Pena de morte na Gâmbia: Comunicado da LGDH


COMUNICADO À IMPRENSA
 
A Liga Guineense dos Direitos Humanos registou com muita tristeza a execução de 9 cidadãos de diferentes nacionalidades perpetradas pelo regime Gambiano no passado dia 26 do corrente mês, no cumprimento da ordem decretada pelo Presidente Yaya Jammeh através de uma mensagem à nação teledifundida no dia 19 de Agosto último, em que ameaçou executar todos os condenados à morte até ao final do mês de Setembro.

Na democracia e no estado de direito, a vida humana é o valor supremo, fundamento e a razão da existência do próprio estado, conquanto, a sua preservação e proteção se traduzem nas obrigações fundamentais dos estados a nível nacional e internacional, independentemente das circunstâncias envolventes ou condições existentes.

Em virtude da sua importância e transcendência, o direito a vida ganhou uma dimensão internacional por força da Declaração Universal dos Direitos Humanos, constituindo assim um limite intransponível ao exercício das soberanias nacionais, ou seja, a questão dos direitos humanos extravasa as fronteiras internas, transformando-se num assunto de interesse universal.

Igualmente, a Liga Guineense dos Direitos Humanos dispõe de informações através da imprensa internacional, segundo as quais, se encontra supostamente de entre os 47 condenados a pena capital, um cidadão de nacionalidade guineense, cuja identidade ainda se desconhece.

Face aos factos acima descritos e o elevado desprimor pela vida e a dignidade da pessoa humana por parte do regime do presidente Yaia Jammeh, a Direcção Nacional da Liga Guineense dos direitos Humanos delibera os seguintes:

1- Condenar sem reservas a execução dos cidadãos numa autêntica afronta aos valores subjacentes ao estado de direito que a República de Gambia proclama defender;
 
2- Lançar um vibrante apelo às autoridades nacionais para que accionem mecanismos legais e diplomáticos com vista a resgatar o cidadão guineense que aguarda a pena cruel no corredor da morte em Gambia.

3- Exortar a União Africana, a transferência imediata da sede da Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos para um outro país, comprometido com os valores dos direitos humanos
 
4- Apelar uma mobilização geral das organizações não-governamentais africanas defensoras dos direitos humanos com vista a criação de uma frente comum de salvaguarda das vidas humanas em Gambia.  
 
Feita em Bissau, aos 28 dias do mês de Augusto de 2012

A Direcção Nacional

terça-feira, 28 de agosto de 2012

A Guiné-Bissau de hoje é uma ilusão


Um 'governo de transição', para começar, não tem os mesmos direitos de um governo legítimo, sufragado na urnas pelo povo. Então, como pode o governo ilegítimo da Guiné-Bissau enviar cem militares guineenses - sob comando do Senegal - para o norte do Mali, uma zona ocupada e pronta para uma guerra sem quartel? Quem autorizou? E com que direito? A verdade é só uma: as autoridades guineenses não têm a noção e nem conhecem os seus limites. Estão-se nas tintas pela constituição, fazem gato-sapato da comunidade internacional, gozam na cara de quem quer que seja e estão a dar cabo da nossa economia. Estão, para dizer as coisas mais claramente, a delapidar a Guiné-Bissau.

Senhor Procurador-Geral da República,

Irmãos nossos podem morrer nessa missão ilegal e inconstitucional. O presidente da República de transição não foi eleito, não foi o partido do primeiro-ministro de transição quem ganhou as eleições a ponto de o indicar como primeiro-ministro. Na nossa constituição não consta sequer o termo 'governo de transição'. Por cada morto ou ferido decorrente dessa missão eu mesmo accionarei uma queixa junto da PGR enquanto cidadão da República da Guiné-Bissau (NOTA: eu tenho uma única nacionalidade, a guineense.)

Senhor Procurador-Geral da República,

Para memória futura: por cada militar guineense ferido ou morto em combate, no Mali, corresponderá a um crime de sangue cometido pelas autoridades da Guiné-Bissau que se decidiram por este acto tresloucado. A missão, atente-se no vocabulário, tem um fim: expulsar a rebelião. Será a guerra portanto.

Caros leitores,

Não tenham dúvidas: a Guiné-Bissau de hoje é uma ilusão. Uma ilusão de arma na mão. E digo-o com a mais profunda das tristezas. A Guiné-Bissau - assim mesmo e sem medo da expressão - não faz parte da agenda internacional. O Mali, sim. A comunidade internacional já não tem forças, nem meios, para dispender com quem anda a brincar com o tempo e a boa vontade dos outros.

A Guiné-Bissau está selada em vácuo, continua cercada política e economicamente. A esmagadora maioria do povo guineense está cansado e tem medo. Não pode sequer manifestar o que sente: esse direito é-lhe tolhido. As ameaças à vida de quem não reconhece o golpe de Estado de 12 de abril continuam, o boato e a mentira persistem; a desconfiança generalizou-se e o medo propaga-se.

Eu, não tenho esperança nenhuma. A única certeza que tenho é esta: se as Nações Unidas, a União Europeia, a União Africana, a Comunidade de Países de Língua Portuguesa e alguns países da CEDEAO continuarem com as torneiras fechadas e o bloqueio político à Guiné-Bissau, o caminho para a perdição chegará mais cedo do que o esperado. António Aly Silva