terça-feira, 25 de março de 2008

O país de coisas únicas

Fotografia DR: António Aly Silva
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Na Guiné-Bissau, é facilmente visível, confia-se cada vez menos nos políticos. Se for feita uma sondagem ao nível da credibilidade destes, verão que os políticos perderão para os padres, os jornalistas, os militares, os juízes. Numa democracia a sério, o desejável é que os partidos políticos actuem como veículos privilegiados de um conjunto de ideias, de uma concepção do mundo, de uma visão da sociedade. Claro que, fazendo aliança com o primeiro que se lhes aparece, negociando sabe-se lá que tipo de «mercadoria», os partidos não cumprem esse papel, muito pelo contrário: deixam pura e simplesmente de ser círculos de ideias para se tornarem em bandos de interesses. Mais. Chega-se até ao ponto de considerar de «radical» e «intransigente» aquele que simplesmente defende o seu ponto de vista acima das conveniências da hora.

As visões do mundo aos olhos dos nossos políticos permanecem distorcidas e não são representadas pelos partidos. Por exemplo, é mais fácil encontrar na Guiné-Bissau uma ONG para defender uma ideia do que um partido político ou o próprio Estado. Isso mais não é do que um sinal eloquente da nossa debilidade partidária. Mas, apesar de tudo, dá, sim, para confiar nos políticos. Em alguns, é claro. Eles não serão os culpados por tais deformações. São apenas a personificação de um sistema partidário que nasceu torto.
Pelo modo como se formou o Estado guineense, e em razão de um paternalismo estatal patético e anacrónico, os partidos políticos não surgiram como canais de expressão de segmentos sociais. Foi o contrário. Primeiro, nasceram e, depois, saíram à procura de carta branca para «representação» deste ou daquele grupo social. Deu no que deu. Ainda está a dar. Certo é que, até hoje, nenhum partido político deste país pode gabar-se de representar a complexidade da nossa sociedade. Ao político do mundo de hoje, exige-se a coragem, a dedicação, a coerência, a integridade, o ser constante. E quanto mais soprarem os novos ventos, menos ele se deve esconder nas golas do casaco – mais prazer e, mais honra terá em dar a cara.

Em suma, há uma dramática falta de normalidade na Guiné-Bissau. Ao nível da cooperação, por exemplo, o normal é que ambos os lados tentem tirar a maior vantagem possível um do outro. O que é normal é que essas relações se baseiem, logo à partida, em relações comerciais com proveito para os dois lados. Eu, por muito que tente não ver, vejo mesmo todo esse desalinho, toda esta fealdade que se não prova a existência de Deus pelo menos prova a existência do Diabo. Temos de deixar de ser um nada onde tudo acontece.

sexta-feira, 21 de março de 2008

Fadul ou a Bomba - quem rebentará primeiro?

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Eu, aposto que o Presidente do Tribunal de Contas irá rebentar... mas só depois de o seu partido amealhar o suficiente para as eleições. Contudo, e segundo a minha fonte, a coisa está a secar mais depressa do que aparenta...
PS - O que é que eu tenho de fazer para o Tribunal de Contas me penhorar o carro, pá?
AAS

Estado e Sodomia

Foto: DIREITOS RESERVADOS - António Aly Silva
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Os guineenses têm sido sempre psicologicamente preparados para sofrer. Eu quando os ouço preparo-me. É óbvio que, quando ouvem isto, os cidadãos temem. E tremem. É o Estado a preparar-se para nos ir ao pacote. Quer dizer, para nos irem ainda mais do que já vão num dia normal. Quando políticos e outros começam a falar assim, numa só voz, então é porque vamos ser “sodomizados”.

Quando o Estado pede sacrifícios aos cidadãos, então é o próprio Estado que tem um problema entre mãos. Vai daí, enquanto pedem “sacrifícios” numa voz séria mas meiga, obrigam os cidadãos a ajoelhar, de costas, a baixar as calças, e zunga!

É claro que eu, em certas circunstâncias, sou perfeitamente capaz de fazer sacrifícios pelo meu País. Mas quase trinta e quatro anos depois da (in) dependência, acho imoral que nos venham pedir mais sacrifícios. Primeiro, porque nós já fizemos esses sacrifícios nos últimos anos; e depois porque, na verdade, nunca os problemas da Guiné-Bissau foram tão culpa do... Estado da Guiné-Bissau.

É verdade que os homens nascem iguais e devem todos ter os mesmos direitos e blá, blá, blá... Porém, há uma grande diferença: nem todos estão ao mesmo nível; uns estão mais avançados que outros e são os que estão mais avançados que devem governar os outros, são eles que sabem. Mas, o que se vê neste País? Os mais atrasados a quererem mandar.

Para que o progresso se faça, é necessário aceitar as diferenças, é necessário que um elemento crie o seu contrário, o qual entrará em contradição com ele para o negar, discutindo, em paz. É que a nós parece que a vida nada ensinou. Se somos cegos, então apalpemos o caminho antes de avançar, senão caímos num buraco.

Os guineenses não têm feito outra coisa nos últimos 34 anos que não pagar do seu parco ordenado para manter a bandalheira do Estado. O Estado está com problemas? Então o Estado que resolva os seus problemas e nos deixe em paz... a minha vida, que já leva 40 anos, tem sido um esforço em mostrar a uns e a outros que há sempre lugar para o talvez.
Por: António Aly Silva
Jornalista

quinta-feira, 20 de março de 2008

Fogo Amigo

Foto: DIREITOS RESERVADOS - António Aly SilvaPhotobucket

Por: António Aly Silva
Jornalista


A mais recente polémica envolvendo a classe jornalística guineense, é grave e podia incorrer em danos maiores, Contudo, pode ser facilmente explicada. O jornalismo feito em Bissau não é fiável, é suspeito; não honra a sua classe, é influenciável. E selvagem.

A Guiné-Bissau devia ser um case study. Primeiro, porque nunca esteve, ao mesmo tempo, tão rico e tão pobre como hoje – nem tão corrupto. Segundo, porque tem a imprensa mais livre de África e, terceiro, porque nada disto deveria estar a acontecer, ainda por cima com – literalmente – toda a gente como espectador...

Como é possível que um jornalista não investigue uma notícia que lhe é passada – independentemente do seu interesse – e nem a analisa no contexto do tempo em que ela ocorre ou lhe é dada? Como se explica que o jornalista em causa não tente sequer confirmar junto de outras fontes, a veracidade dessa mesma notícia – e, não menos importante, porque não falou ele com o gabinete de imprensa do Estado-Maior General das Forças Armadas? Ou pura e simplesmente o jornalista não terá entendido o conteúdo daquilo que lhe foi dito?

Tive situações semelhantes (com as devidas diferenças, bem entendido) enquanto jornalista do semanário português «O Independente». Quando Ansumane Mané morreu, fui logo «notificado» por uma fonte, por sinal muito bem informada, do acontecido. Ouvi, engoli em seco, agradeci, desliguei o telefone e, num ápice comecei a corrida para a verdadeira cacha: a de confirmar, junto de outras fontes, independentes mas não menos credíveis, uma possível notícia ou não-notícia e/ou uma fraude/armadilha.No caso da morte do general, tratou-se mesmo de uma notícia: verdadeira, confirmada e reconfirmada, depois publicada, com repercussões em todo o mundo.
Contudo, foi uma dor de cabeça convencer o meu editor na altura, e a directora do jornal a publicar a notícia com o devido destaque: Foi manchete do caderno ‘Mundo’. E como se fez isso? Com a língua portuguesa. Escreveu-se: «Ansumane Mané, terá sido morto…», salvando-se assim o dia, a fonte e o que mais houvera.

O lead não acobarda ninguém, bem pelo contrário: salvaguarda o jornalista e o órgão para o qual trabalha, que é o que mais interessa. E dignifica a classe. Ainda assim, tivemos que enfrentar (eu e o jornal) um processo judicial movido pelo ministro da Defesa de Portugal na altura, Castro Caldas, para além de um comunicado escrito e difundido a cada meia hora pela rádio nacional, com a linguagem que se adivinha, do Presidente da República Koumba Yalá a ameaçar com os tribunais, caso as coisas não se ficassem por ali... «Este jornalista é um artista, e se houver por aqui artistas também vamos saber», numa clara indirecta às minhas fontes.
Nunca revelei uma na minha vida de jornalista. São nomes que me acompanharão até ao meu eterno descanso, na minha campa rasa e fria. No caso particular do titular da pasta da Defesa português, a coisa lá se arrastou, tendo há pouco chegado ao fim sem danos de maior para qualquer dos lados, e muito menos os danos colaterais que imagináramos, isto para falar dos advogados do jornal. Kumba Yalá desistiu de levar para a frente os seus intentos, pois também não tinha onde se segurar…

No caso guineense, do alarmante «desarmamento de esquadras», não me cheirou a armadilha, mas sim a precipitação jornalística; não se tratou de uma não-notícia … mas de uma notícia mal entendida. Voilá! É isso, alguns jornalistas entendem mal, levando a que quem os leia caie no descrédito e no ridículo. Basta abrir um jornal ou sintonizar uma estação de rádio, para se perceber como é que se traduzem (!) os noticiários, no caso das rádios; e/ou os textos de português ou sabe-se lá de que língua, no caso dos jornais. Um perfeito disparate, é o que é.

A isto chamo de copiar pela negativa. Não há uma preparação prévia, não se revêem os textos, nenhum apresentador os lê antes de ir para o ar. Nada. Limitam-se, às vezes num perfeito descaramento, a debitar disparate atrás de disparate, perante uma audiência dividida entre aqueles que gabam o apresentador, e os que, como eu, ouvem com espanto e de boca aberta.
Quando um jornal se decide pela publicação do que quer que seja, é bom que tenha onde se agarrar depois. Nada prejudica mais uma publicação, do que cair no descrédito junto dos seus leitores. Ou revelar a fonte de uma informação. Se um jornalista cair na asneira de revelar uma fonte, bem que pode começar a procurar outra profissão… de polícia, por exemplo!

Tenho acompanhado com acentuada preocupação, a situação na Guiné-Bissau. Acompanho o que lhe passa ao perto e ao longe, enxergo o que lhe mal fazem, ocultam, tramam, sonegam, roubam. Percebo onde lhe alvejam, meço o quanto lhe cerceiam ou destroem. Tenho-me contido, não acobardado. Eu sou apenas a favor da Guiné-Bissau. Contra os que lhe mal fazem, os que lhe roubam.

PS – Alguém comentou numa mesa de café, que o «Aly tem sido subserviente ao poder político, anda muito calado». Ora bem. Quanto à minha subserviência ao poder político, «exemplar» ainda por cima, não há muito que dizer: como não assenta em factos, trata-se pois de uma reles calúnia. E às calúnias responde-se com os tribunais, com o desprezo ou com um par de estalos. Sei que não se deve gastar cera com ruins defuntos, mas como esse alguém em causa é pantomineiro e ordinário, vou deixar ao meu humor vagabundo a decisão sobre qual destas formas de retaliação me trará mais prazer e menos incómodo. AAS